Índice
- 1 Quais as opções de tratamento para diabetes tipo 2 ?
- 2 Passo a passo da prescrição da insulinoterapia para DM2
- 3 Primeira etapa do tratamento
- 4 Segunda etapa do tratamento com insulinoterapia
- 5 Terceira etapa do tratamento
- 6 Quarta etapa do tratamento com insulinoterapia
- 7 O que não podemos esquecer de orientar ao paciente que irá começar a usar insulina?
- 8 Como o paciente deve fazer a aplicação da insulina?
- 9 Ao iniciarmos, a insulinoterapia deve ser mantida para “sempre”? Como abordar o medo/frustração do paciente no início do tratamento?
- 10 Referências bibliográficas
- 11 Sugestão de leitura complementar
Confira neste artigo do Dr. Alexandre Câmara uma análise sobre insulinoterapia para o diabético tipo 2.
Em teoria, a insulinoterapia é opção em qualquer momento do tratamento do Diabetes Mellitus do tipo 2 (DM2).
Contudo, apesar de até metade dos pacientes necessitarem deste tratamento, como você deve perceber, não é habitual esta prescrição como abordagem inicial pacientes “não descompensados”, sendo geralmente preferida outras indicações
Quais as opções de tratamento para diabetes tipo 2 ?
Se os alvos de glicemia não estiverem sendo atingidos (geralmente uma hemoglobina glicada A1C abaixo de 7,0% para a maioria dos pacientes) apesar do uso de uma combinação de agentes não insulínicos, a insulina pode ser adicionada ao regime terapêutico.
Além disso, a insulina é frequentemente necessária quando pacientes com diabetes tipo 2 são hospitalizados ou sofrem de uma doença aguda, como infecções. Estas condições podem aumentar significativamente a resistência à insulina e a insulina exógena pode ser necessária para manter o controle glicêmico.
A insulina também é o tratamento de escolha para mulheres grávidas com diabetes tipo 2, pois a maioria dos agentes orais não é aprovada para uso durante a gravidez devido à falta de dados de segurança ou evidência de danos potenciais ao feto.
Muitos agentes orais para diabetes são contraindicados em pacientes com insuficiência renal ou hepática significativa. Nestes casos, a insulina é frequentemente a melhor escolha de tratamento.
Paciente com sintomas e/ou em estado catabólico
Se um paciente tem sintomas severos de hiperglicemia (como perda de peso não intencional, poliúria, polidipsia) ou cetoacidose diabética, a insulina é necessária.
Passo a passo da prescrição da insulinoterapia para DM2
A implementação da insulinoterapia deve ser feita de forma cuidadosa, iniciando com doses menores e ajustes criteriosos e graduais. Esse procedimento busca prevenir episódios de hipoglicemia, promovendo assim uma maior aderência ao tratamento por parte do paciente.
Tabela 01: formulações de insulina disponíveis no Brasil

Antes de discutirmos as condutas específicas, é essencial salientar que, ao contrário do diabetes tipo 1 (DM1), no qual a capacidade de secreção de insulina é totalmente perdida, impedindo tanto a secreção basal (que regula a liberação hepática de glicose durante o jejum) quanto a secreção prandial (em resposta à alimentação).
O diabetes tipo 2 (DM2) geralmente ainda preserva algum nível de reserva pancreática. No entanto, devido à resistência à insulina, a descompensação tende a ocorrer mais precocemente, especialmente no início da manhã ou no final da noite, devido ao aumento da produção hepática de glicose. Sabendo disso, vamos detalhar como é, em geral, a sequência da insulinização destes pacientes:
Figura 01: Perfis de ação das diferentes insulinas

DIABETES TIPO 2: ALGORITMO SBD. 2019
Primeira etapa do tratamento
A insulina para cobertura da liberação basal de glicose (intermediária, longa ou ultralonga) é o tratamento inicial mais conveniente. Em geral, prescrevemos uma única dose de insulina humana NPH ou de análogos de insulina de longa duração (como glargina U100 ou detemir) ou de ultralonga duração (como degludeca ou glargina U300) ao dormir, combinada com medicamentos não insulínicos.
Quanto a escolha da insulina, quanto mais lenta a ação, menor será o pico sérico da insulina e menor o risco de hipoglicemia. Portanto, em relação ao risco de hipoglicemia, a ordem é a seguinte: NPH > Detemir > Glargina U100 > Glargina U300 = Degludeca.
A imagem abaixo mostra alguns parâmetros para levar em consideração na escolha da insulina prandial.
Figura 2. Sugestão de escolha de insulinas basais de acordo com a prioridade clínica.

Qual objetivo da insulina noturna?
A dose de insulina noturna tem como objetivo diminuir a produção de glicose pelo fígado, melhorando assim a glicemia, especialmente em jejum.
A dose inicial sugerida é de 10 UI ou 0,2 UI/kg, com ajustes baseados na glicemia em jejum.
Quando os ajustes devem ser feitos?
Os ajustes devem ser feitos a cada 2 a 3 dias para permitir que o organismo se adapte à nova dose de insulina. Aqui está uma das inúmeras estratégias que podem ser utilizadas neste momento:
- Se a glicemia de jejum for consistentemente superior a 130 mg/dL, a dose de insulina deve ser aumentada em 2 a 4 unidades (costumo orientar + 4Ui quando glicemia acima de 180 mg/dL)
- Se qualquer valor de glicemia de jejum for inferior a 90 mg/dL, a dose de insulina deve ser reduzida em 2 UI e se hipoglicemia diminuir 4 UI.
Depois que a glicemia de jejum estiver consistentemente na faixa alvo (geralmente entre 90 e 130 mg/dL, mas pode variar de acordo com as necessidades individuais do paciente), a hemoglobina glicada (HbA1c) também deve ser monitorizada para avaliar o controle glicêmico de longo prazo.
Segunda etapa do tratamento com insulinoterapia
Se persistir a hiperglicemia com utilização de doses de insulina basal acima de 0,5 ui/kg/dia ou apesar da glicemia de jejum normal e a Hba1c mantiver acima da meta devido à hiperglicemia pós-prandial, adotaremos o esquema chamado de “basal-plus”.
Isso consiste em combinar uma dose de insulina regular ou análogo de ação rápida na principal refeição ou naquela com maior excursão pós-prandial. Uma dose de insulina prandial de 4 unidades ou 10% da quantidade de insulina basal uma estimativa segura para iniciar a terapia.
Terceira etapa do tratamento
Se a hiperglicemia pós-prandial ocorrer após mais de uma refeição, ampliamos o esquema basal-plus para incluir uma segunda dose de insulina ou análogo de ação rápida.
Por segurança, em geral iniciamos da mesma forma que na segunda etapa.
Quarta etapa do tratamento com insulinoterapia
Caso os esquemas anteriores não produzam uma resposta adequada, recomenda-se a insulinização completa (esquema basal-prandial), com:
- Insulina basal podendo ser aplicada em uma dose (glargina U100, glargina U300 e degludeca), duas doses (glargina U100, detemir e NPH) ou em até três aplicações (NPH), antes do café e almoço e antes de dormir.
- O regime de insulina prandial antes do café, almoço e jantar, que pode ser intensificado com base nas necessidades individuais.
Não há limite na dose de insulina que pode ser administrada, o importante é que seja alcançado os alvos. Não se preocupe, é comum Indivíduos com diabetes tipo 2 requerem doses diárias mais altas (∼1 unidade/kg) do que aqueles com diabetes tipo 1. Visto que, são mais resistentes à insulina. Dessa forma, isso também leva a taxas mais baixas de hipoglicemia.
O que não podemos esquecer de orientar ao paciente que irá começar a usar insulina?
É fundamental orientar sobre o reconhecimento de efeitos colaterais em pacientes que fazem uso de insulina, e o mais importante é a hipoglicemia. As seguintes orientações podem ser dadas a um paciente para a correção de hipoglicemia (glicemia < 70 mg/dL):
- Consumir uma fonte imediata de carboidratos simples: 15-20 gramas. Exemplos incluem 4-6 balas, 1 colher de sopa de mel ou açúcar, 1/2 copo (120 ml) de suco de fruta ou refrigerante regular (não dietético), ou pacotes comerciais de glicose de ação rápida disponíveis em farmácias.
- Depois de consumir carboidratos, espere cerca de 15 minutos e verifique novamente os níveis de glicose no sangue
- Repita, se necessário: Se a glicose no sangue ainda estiver abaixo de 70 mg/dL, é necessário repetir a etapa 1. Continue a repetir essas etapas até que a glicose no sangue retorne ao intervalo normal.
- Se a próxima refeição programada estiver a mais de uma hora de distância, consuma um pequeno lanche após a correção para ajudar a estabilizar seus níveis de glicose no sangue. O lanche deve incluir carboidratos complexos e proteínas. Exemplos incluem uma fatia de pão integral com manteiga de amendoim ou um iogurte com um punhado de nozes.
Hipoglicemia em pacientes idosos
O aumento do risco de hipoglicemia em pacientes mais idosos com comorbidades, pode aumentar o risco cardiovascular. No entanto, deve-se ressaltar que os sintomas são inespecíficos (sudorese, fome, taquicardia…), e é preciso sempre confirmar se realmente a glicemia < 70 mg/dL.
É comum que inicialmente o paciente apresente sensação de hipoglicemia mesmo com glicemia normal, neste caso devemos orientar para hidratar-se bem, que os sintomas são transitórios e não é necessário a correção, sob o risco de dificultar o controle a longo prazo.
Outro efeito comum é o ganho de peso, relacionado ao efeito anabólico do hormônio. Contudo, é importante avaliar a possibilidade de excesso de consumo de calorias em resposta as hipoglicemias.
Estocagem do medicamento
É necessário estocar o frasco fechado na geladeira a 4°C (2 a 8°C), de preferência na gaveta de baixo da geladeira, aquela das frutas e verduras (onde geralmente é mantida essa temperatura) e evitar guardar na porta, onde estará susceptível a variações térmicas. Se congelar, desprezá-lo.
Após aberta, a insulina pode ser mantida em temperatura ambiente (até 28-30°C), sem calor excessivo ou exposição à luz. Pode manter em geladeira, mas o ideal é retirar no mínimo 30 minutos antes de aplicar, a fim de minimizar dor no local da injeção.
Além disso, após aberta, a insulina tem validade limitada, e dependendo da insulina (Tabela 1), perde sua potência e deve ser descartada de 28 a 56 dias. Em viagens, ela deve ser carregada em isopor ou caixa térmica sem gelo ou com gelo seco. Pode também ser levada em bolsa comum, desde que a insulina não seja exposta à luz solar ou calor excessivo.
Seringas, canetas e agulhas
Idealmente, as seringas devem ser de uso único, mas é possível a reutilização pela própria pessoa, desde que a agulha e a capa protetora não tenham sido contaminadas. Não se recomenda higienização da agulha com álcool. Não é recomendado reutilizar muitas vezes a mesma agulha, pois aumenta o risco de lipohipertrofia.
Existem três modelos de seringa, com diferentes capacidades — 30, 50 ou 100 UI — de insulina. Nas duas primeiras, cada marcação da seringa equivale a 1 UI, enquanto na de 100 UI cada ponto equivale a 2 UI. Portanto, não é possível a prescrição de doses ímpares se o paciente usa seringa de 100 UI (figura 3).

As agulhas das seringas variam de 12,7 a 6 mm, já as canetas têm disponibilidade de agulha até 4 mm. Isso gera menor incômodo ao paciente. O descarte da seringa deve ser realizado em recipiente próprio.

Preparo da insulina
Antes de cada aplicação, as mãos e o sítio de aplicação devem ser limpos.
Deve-se limpar a tampa de borracha do frasco de insulina com álcool. A insulina NPH, por ser uma suspensão, deve ser administrada à temperatura ambiente e misturada imediatamente antes da injeção. Isso é feito rolando a caneta ou o frasco de insulina em suas mãos pelo menos 10 vezes e, em seguida, invertendo a caneta ou frasco pelo menos 10 vezes.
Para retirar a insulina do frasco, a agulha deve ser introduzida no centro da tampa de borracha, de forma perpendicular. Um volume de ar igual à dose de insulina requerida deve ser introduzido dentro do frasco, para evitar a formação de vácuo.
As insulinas NPH podem ser associadas na mesma seringa com as insulinas para cobertura prandial (lispro, glulisina, asparte ou regular). Mas as rápidas ou ultrarrápidas devem ser aspiradas antes, para evitar que a protamina, presente na NPH, entre em contato com as outras insulinas. Já os análogos de longa ação e a Glargina U300 não podem ser associados com as insulinas prandiais.

Como o paciente deve fazer a aplicação da insulina?
Deve ser orientado a realização de rodízio dos locais de aplicação subcutânea da insulina.
Figura 05 – Locais de aplicação da insulina.

Se uso de seringa, é feito prega na pele antes de aplicar (Figura 6). As canetas de insulina, com agulha de 4 mm, dispensam a necessidade de prega.
Figura 06. Prega para aplicação de insulina.

Após a injeção de insulina, recomenda-se que a agulha permaneça no subcutâneo por cerca de 5 a 10 segundos. Isso garante que toda a dose de insulina seja entregue ao tecido subcutâneo, reduzindo a chance de vazamento da insulina a partir do local da injeção. Isso é particularmente importante para insulinas de ação rápida.
Além disso, ao retirar a agulha, é importante não esfregar o local da injeção, pois isso pode aumentar a absorção da insulina, potencialmente levando a flutuações na glicemia.
Ao iniciarmos, a insulinoterapia deve ser mantida para “sempre”? Como abordar o medo/frustração do paciente no início do tratamento?
É fundamental que no momento da abordagem com o paciente com DM2, a insulinoterapia não seja usada como “punição”. Por exemplo: “como você não se cuidou, agora vai precisar de insulina”.
É importante que seja reforçado as vantagens do tratamento e desmistificado alguns “pré-conceitos”. Na prática, alguns pontos que deve-se pontuar com os pacientes:
- A insulina controlará a glicemia e ajudará a prevenir complicações
- Este tratamento pode ser menos complicado do que regimes medicamentosos
- Benefícios do controle da glicose: mais energia, melhor sono, bem-estar
- O desconforto é mínimo com agulhas mais finas
Um outro ponto que deve ser pontuado é que este tratamento NÃO é, obrigatoriamente, uma “sentença” perpétua. É comum que haja necessidade da insulinoterapia durante a fase de glicotoxicidade. Essa fase se refere ao dano provocado por altas concentrações de glicose no sangue, levando ao estresse oxidativo no pâncreas.
Esse estresse “paralisa” as células beta, reduzindo a secreção de insulina e aumentando a resistência à ação da insulina. Mas após reduzir a glicotoxicidade, pode haver uma melhora da secreção de insulina, e pode ser necessário reduzir as doses ou mesmo suspendê-la, já que possível que o paciente volte a “responder” ao tratamento com antidiabéticos orais.
Referências bibliográficas
- American Diabetes Association. ADA Standards of Medical Care in Diabetes Care. Pharmacologic Approaches to Glycemic Treatment. 2023- https://diabetesjournals.org/care/article/46/Supplement_1/S140/148057/9-Pharmacologic-Approaches-to-Glycemic-Treatment
- Filho R, Albuquerque L, Cavalcanti S, Tambascia M, Valente F, Bertoluci M. Tratamento farmacológico da hiperglicemia no DM2. Diretriz Oficial da Sociedade Brasileira de Diabetes (2022). DOI: 10.29327/557753.2022-10, ISBN: 978-65-5941-622-6. https://diretriz.diabetes.org.br/tratamento-farmacologico-da-hiperglicemia-no-dm2/#ftoc-formulacoes-e-combinacoes-de-insulinas-disponiveis-no-brasil.
- Posicionamento Oficial SBD no 01/2019. CONDUTA TERAPÊUTICA NO DIABETES TIPO 2: ALGORITMO SBD. 2019.