Dermatologia

Pioderma Gangrenoso: o que é, diagnóstico, tratamento e mais

Pioderma Gangrenoso: o que é, diagnóstico, tratamento e mais

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Confira no artigo da Dra. Gabriela Noronha tudo que você precisa saber sobre pioderma gangrenoso para prática dermatológica. 

O pioderma gangrenoso (PG) é uma dermatose neutrofílica que se apresenta como um distúrbio inflamatório e ulcerativo da pele. É uma doença rara que acomete principalmente mulheres. A idade média de início é entre 40 e 60 anos, mas pode acometer indivíduos de qualquer idade, incluindo crianças.

A maioria dos pacientes com PG desenvolvem o distúrbio em associação com uma doença sistêmica subjacente, sendo as principais: doença inflamatória intestinal, distúrbios hematológicos e artrite.

Quais as características dos Pioderma Gangrenoso?

O PG caracteriza-se por infiltrados predominantemente neutrófilos na pele. Acredita-se que ocorra uma desregulação na resposta imune inata e adaptativa, além de fatores genéticos.

A pele lesada tem expressão aumentada de interleucina (IL) 1-beta, IL-1-alfa, IL-8, IL-12, IL-15, IL-17, IL- 23, IL-36 e fator de necrose tumoral (TNF)-alfa. O tecido lesado também tem expressão aumentada de receptores de reconhecimento de padrão (PRRs), JAK2 e STAT1, implicando disfunção da resposta imune adaptativa e inata.

Quais as manifestações clínicas do Pioderma Gangrenoso?

As manifestações clínicas do PG são variáveis e podem ser divididas em quatro subtipos principais:

  • PG ulcerativo (variante mais comum)
  • PG bolhoso (atípico)
  • Pustuloso
  • PG vegetativo.

Os subtipos de PG compartilham um curso clínico caracterizado pelo aparecimento de uma pápula, pústula, vesícula ou nódulo inflamatório que progride para uma erosão ou úlcera dolorosa.

Com exceção do PG vegetativo, o desenvolvimento da lesão costuma ser rápido e o nível de dor costuma ser maior do que o esperado com base na aparência da úlcera. Sintomas sistêmicos nem sempre estão presentes. Um achado clássico que pode estar presente nos pacientes com PG é a patergia, termo usado para descrever a indução ou exacerbação do PG em locais de trauma.

Variantes do Pioderma Gangrenoso

Saber as variantes dessa doença é importante para o tratamento e prognóstico.

PG ulcerativo (clássico)

Geralmente começa como uma pápula, pústula ou vesícula sensível e inflamatória que se desenvolve na pele de aparência normal ou em um local de trauma. Os membros inferiores e o tronco são os locais mais acometidos. As lesões podem ser únicas ou múltiplas.

A lesão inflamatória inicial se expande e leva à formação de uma úlcera. A borda da úlcera geralmente apresenta coloração violácea. A base da úlcera é purulenta e necrótica, e a profundidade pode se estender até o subcutâneo. Ocasionalmente pode atingir a fáscia. Estas úlceras geralmente se resolvem com cicatrizes atróficas e cribiformes.

Fonte: Rodríguez-Zuniga MJM, Heath MS, Gontijo JRV, Ortega Loayza AG.

Bolhoso (atípico)

É uma variante superficial menos comum. É frequentemente relacionada à doença hematológica. Os membros superiores e a face são os locais mais acometidos.

O quadro clínico se desenvolve com o rápido surgimento de bolhas inflamatórias azul- acinzentadas. Estas bolhas erodem rapidamente, resultando em úlceras superficiais.

Pioderma Gangrenoso pustuloso

Muito associado a períodos de exacerbações agudas das doenças inflamatórias intestinais. A clínica evolui com rápido desenvolvimento de pústulas dolorosas circundadas por eritema. Febre e artralgia são comuns.

PG vegetativo

Também conhecido como PG superficial, é uma forma de PG tipicamente:

  • Localizada
  • Solitária
  • Superficial que se apresenta como um nódulo, placa ou úlcera indolente e levemente doloroso.

Tem característica mais vegetante e as bordas minadas e as bases purulentas do PG ulcerativo estão ausentes. A cabeça, o pescoço e o tronco são os locais mais comumente acometidos.

Fonte: Rodríguez-Zuniga MJM, Heath MS, Gontijo JRV, Ortega Loayza AG.

Periestomal

Manifestação incomum que se caracteriza pelo desenvolvimento de lesões consistentes com PG ulcerativo adjacente a um estoma.

Geralmente ocorre em pacientes com colite ulcerativa ou doença de Crohn e pode se desenvolver meses a anos após a colocação de um estoma.

Pioderma Gangrenoso genital

Pode envolver a vulva, o pênis ou o escroto. Assemelham-se às lesões do PG ulcerativo.

Pioderma Gangrenoso extracutâneo

Muito raro. Acomete locais como:

  • Pulmões
  • Intestino
  • Córnea
  • Fígado
  • Baço
  • Coração
  • Ossos
  • Músculos
  • Sistema nervoso central.

Pós-operatório

É o desenvolvimento de PG em um local cirúrgico, mais comumente em até duas semanas após o procedimento.

O quadro inicia-se com eritema no local da cirurgia e dor extrema desproporcional ao exame físico, seguida de deiscência da ferida e ulcerações puntiformes que coalescem em úlceras maiores. Os locais mais comuns são as mamas e o abdome.

Fonte: Rodríguez-Zuniga MJM, Heath MS, Gontijo JRV, Ortega Loayza AG.

Como fazer o diagnóstico do Pioderma Gangrenoso?

Os achados clínicos, histopatológicos e laboratoriais são inespecíficos, e o diagnóstico só pode ser feito após a exclusão de outras doenças.

Quais os passos para o diagnóstico?

A anamnese do paciente com suspeita de PG deve questionar sobre a história do desenvolvimento da lesão, sintomas associados e história médica pregressa:

  • Curso rápido de desenvolvimento da lesão
  • Lesão inicial consistente com pápula, pústula ou vesícula
  • Dor fora de proporção com a lesão
  • História de trauma anterior (patergia)
  • Histórico de comorbidades associados ao PG

No exame físico deve-se avaliar a extensão da doença, detectar distúrbios associados ao PG e excluir outros diagnósticos diferenciais.

Biópsia

A Biópsia é fundamental para descartar outros distúrbios e garantir o tratamento adequado.

  • Técnica: biópsia do tipo incisional elíptica abordando a borda da lesão inflamada e a borda da úlcera (até o tecido subcutâneo). Uma amostra deve ser enviada para exame histopatológico de rotina e coloração microbiana; e outra amostra enviada para cultura bacteriana, fúngica e de micobacterioses atípicas.
  • Anatomopatológico: os achados são inespecíficos. É possível observar inflamação perifolicular e formação de abscesso intradérmico. Uma vez que as lesões progridem para ulceração, necrose epidérmica e dérmica superficial com infiltrado de células inflamatórias mistas subjacentes e formação de abscesso são tipicamente detectadas. Células gigantes podem ser encontradas e tecido da borda da lesão pode demonstrar alterações vasculares sugestivas de vasculite linfocítica. Vasculite leucocitoclástica também pode estar presente.

Diagnóstico diferencial

Diversas afecções dermatológicas. Entre elas:

  • Oclusão vascular
  • Doença venosa
  • Vasculite
  • Malignidade
  • Infecção cutânea
  • Drogas
  • Lesão tecidual exógena
  • Distúrbios inflamatórios ulcerativos

Dentre as principais doenças, podemos citar:

  • Síndrome do anticorpo antifosfolípide
  • Úlceras de estase venosa
  • Granulomatose com poliangeíte
  • Úlceras factícias
  • Esporotricose
  • Poliarterite nodosa
  • Vasculopatia livedoide
  • Linfoma de células T angiocêntrico
  • Crioglobulinemia
  • Fasciíte necrosante.

Tratamento do Pioderma Gangrenoso

O primeiro passo é o cuidado adequado das feridas, evitando desbridamento exacerbado pelo risco de patergia.

Doença limitada

  • Corticoide tópico de alta potência (Clobetasol) 1-2x ao dia
  • Corticoide intralesional (Triancinolona entre 6 e 40 mg/m)
  • Inibidores da Calcineurina tópica (0,03-0,1%) 1-2x ao dia

Espera-se indícios de melhora em duas a três semanas, caso ausência de melhora, avaliar troca terapêutica.

Pioderma Gangrenoso mais extenso ou de rápida progressão

Primeira linha de tratamento:

  • Corticoesteroides via oral: Prednisona com dose inicial 0,5 a 1,5 mg/kg por dia. O objetivo é reduzir e descontinuar o corticoide dentro de 4 a 10 semanas.
  • Ciclosporina sistêmica para pacientes que não toleram a terapia sistêmica com glicocorticoides, dose inicial de 4 mg/kg por dia

Para pacientes que não respondem a primeira linha, pode-se fazer mão de imunomoduladores sistêmicos, como:

  • Biológicos
  • Micofenolato de mofetil (2- 3g ao dia)
  • Metotrexato (10 a 30mg por semana)
  • Azatioprina (100 a 300mg por dia)
  • Dapsona (50 a 200 mg por dia)
  • Minociclina (100 mg duas vezes por dia).

O infliximabe (anti-TNF) demonstrou eficácia para o PG em estudo randomizado.

Prognóstico

Mais de 50% dos pacientes atingem a cicatrização completa da ferida em um ano. O PG normalmente cursa com cicatrizes que podem ser desfigurantes.

Novas lesões podem se desenvolver durante ou após a cicatrização de outras lesões. As recaídas podem aparecer após longos períodos de quiescência da doença.

Referência bibliográfica

  1. Lu JD, Milakovic M, Ortega-Loayza AG, et al. Pyoderma gangrenosum:
    proposed pathogenesis and current use of biologics with an emphasis on
    complement C5a inhibitor IFX-1. Expert Opin Investig Drugs 2020; 29:1179.
  2. Ortega-Loayza AG, Nugent WH, Lucero OM, et al. Dysregulation of
    inflammatory gene expression in lesional and nonlesional skin of patients with pyoderma gangrenosum. Br J Dermatol 2018; 178:e35.
  3. Maverakis E, Ma C, Shinkai K, et al. Diagnostic Criteria of Ulcerative
    Pyoderma Gangrenosum: A Delphi Consensus of International Experts. JAMA Dermatol 2018; 154:461.
  4. Ortega-Loayza AG, Friedman MA, Reese AM, et al. Molecular and Cellular
    Characterization of Pyoderma Gangrenosum: Implications for the Use of
    Gene Expression. J Invest Dermatol 2022; 142:1217.
  5. Rodríguez-Zuniga MJM, Heath MS, Gontijo JRV, Ortega Loayza AG. Pyoderma gangrenosum: a review with special emphasis on Latin America literature. AnBrasDermatol. 2019;94:729—43.

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