O Acidente Vascular Cerebral é a segunda maior causa de morte no mundo e a principal causa de morte no Brasil. É definido como um déficit neurológico geralmente focal, de instalação súbita ou com rápida progressão, sem outra causa aparente que não vascular, com duração maior de 24 horas.
O AVC pode ser isquêmico (AVCI), o que corresponde a cerca de 80% dos casos ou hemorrágico (AVCH), 20% dos casos. O AVCH pode se apresentar como Hemorragia Intraparenquimatosa (HIP) ou Hemorragia Subacacnóidea (HSA), como detalharemos mais adiante.
FISIOPATOLOGIA
- ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL ISQUÊMICO
É o infarto de um território encefálico nutrido por uma artéria que sofre oclusão aguda. Na região com isquemia o dano estrutural é irreversível, mas existe uma região chamada zona de penumbra isquêmica, que está funcionalmente comprometida, mas estruturalmente viável.
Principais mecanismos do ACVI:
- Trombose de grandes vasos: relacionado principalmente à doença aterosclerótica;
- Cardioembolismo: miocardiopatia, valvopatias e arritimias. Fibrilação atrial é a mais comum;
- Trombose de pequenas artérias: pequenos infartos nas profundidades dos hemisférios ou tronco encefálico. Muito associado a HAS e DM.
- Outros: arterites, trombofilias, dissecções arteriais cervicais.
- HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA (HIP)
A HAS leva a alterações patológicas crônicas nas paredes das pequenas artérias e arteríolas, levando a formação de aneurismas, que quando se rompem levam a HIP. Após a hemorragia ocorre edema, organização do coágulo e compressão de tecidos adjacentes. Regiões mais frequentes de hemorragia intraparenquimatosa:
A – Lobar
B – Núcleos da base
C – Tálamo
D – Ponte
E – Cerebelo
- HEMORRAGIA SUBARACNÓIDEA (HSA)
A principal causa é a ruptura de aneurismas saculares intracranianos. É extremamente grave, levando à morte em 32% a 67% dos casos. Ocorre principalmente na artéria comunicante anterior, artéria comunicante posterior e artéria cerebral media.
QUADRO CLÍNICO
A apresentação clínica do paciente com AVC pode ser muito variável, já que os sintomas dependem região acometida. Porém sempre devemos suspeitar de AVC em: déficit neurológico, súbito ou com rápida progressão.
- AVCI
No quadro abaixo estão os sintomas mais comuns de acordo com a artéria acometida (lembrando que a mais afetada é a artéria cerebral média).
ARTÉRIA ACOMETIDA |
QUADRO CLÍNICO |
Artéria Cerebral Média (ACM) |
Déficit motor (predomínio braquiofacial), déficit sensitivo, afasia |
Artéria Cerebral Anterior (ACA) |
Déficit motor (predomínio em MMII), déficit sensitivo, sinais de frontalização* |
Artéria Cerebral Posterior (ACP) |
Alterações de campo visual, rebaixamento do nível de consciência, déficit sensitivo |
Artéria basilar |
Déficit motor, déficit sensitivo, rebaixamento do nível de consciência, alteração de nervos cranianos |
Artéria vertebral |
Náuseas, vômitos, tonturas; alteração de nervos cranianos baixos, alterações cerebelares |
* reflexos de preensão palmar, de sucção e de projeção tônica dos lábios.
- AVCH
HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA |
HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA |
Déficit neurológico focal súbito Cefaleia, náuseas e vômitos Redução do nível de consciência Níveis pressóricos muito elevados Crise convulsiva em alguns casos |
Cefaleia súbita (em geral intensa e holocraniana) Náuseas e vômitos Tonturas Sinais de irritação meníngea |
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico é baseado no exame físico, história clínica direcionada e exame de imagem, sendo a tomografia de crânio o mais utilizado. O exame de neuroimagem é fundamental para estabelecer o diagnóstico e a partir daí, iniciar as condutas terapêuticas desses pacientes.
- Exame físico fundamental:
- Anamnese direcionada: é muito importante tentar estabelecer o momento exato em que os sintomas começaram, já que isso é fundamental para algumas condutas terapêuticas. Além disso, temos que investigar os fatores de risco associados e a história médica pregressa.
- Exames de imagem:
AVCI: frequentemente a TC do AVCI não manifesta alterações na fase aguda e o diagnóstico é feito pela exclusão de AVCH. Em alguns casos, a ACM hiperdensa pode ser um sinal precoce do AVCI como a seta indica na imagem ao lado.
AVCH – HIP: apresenta-se como uma imagem hiperatenuante no parênquima encefálico. Em geral com limites bem definidos, podendo causar complicações estruturais como distorção dos ventrículos adjacentes e desvio da linha média, como podemos observar na TC ao lado:
AVCH – HSA: apresenta-se como imagem hiperatenuante dentro das cisternas e sulcos cerebrais.
TRATAMENTO
- AVCI
Temperatura: manter em até 38º C
Glicemia: manter entre 140-180 mg/dL
Pressão arterial: de forma geral, não deve ser tratada devido a contribuição para a manutenção da pressão de perfusão cerebral (PPC). Exceção:
- Manter a PAS < 185 mmHg e PAD < 110 mmHg antes de iniciar trombólise
- Durante e 24 horas após tratamento trombolítico
- 1ª opção: labetalol 10-20 mg EV em 1-2 min, manter 2-8 mg/min em BIC
- 2ª opção: nitroprussiato – BIC iniciar com 0,1-0,3 ug/kg/min, aumentar a cada 5 min
Trombólise: deve ser feita nos pacientes com AVCI sem contraindicações e instalação do déficit neurológico menor de 4,5 horas com alteplase IV (0,9mg/kg, dose máxima de 90 mg em 1h).
Contraindicações absolutas para trombólise:
- Anticoagulação oral e tempo de protrombina > 15 seg (RNI > 1,7)
- Uso de heparina nas últimas 48 horas com TTPa elevado
- Plaquetas < 100.000/mm³
- AVCI ou TCE grave nos últimos 3 meses
- Punção liquorica e arterial a menos de 7 dias
- Persistência da PAS > 180 mmHg ou PAD > 105 mmHg, ou necessidade de medidas para reduzir a PA
- Melhora rápida dos sinais neurológicos
- AVCH prévio
- Sangramento interno ativo (exceto menstruação)
Contraindicações relativas para trombólise:
- Sangramento urinário ou TGI nos últimos 21 dias
- Cirurgia de grande porte nos últimos 14 dias
- IAM nos últimos 3 meses
- Pericardite pós IAM
- HGT< 50 mg/Dl ou > 400 mg/dL
- AVCH – HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA
- A PAM deve ser mantida < 130 mmHg;
- Controle da pressão intracraniana: Manitol 20%: 0,5 a 1,0 g/kg, via intravenosa, em 3 a 30 minutos; Hiperventilação para reduzir a PaCO2 entre 30-35 mmHg; Sedoanalgesia: midazolam/fentanil/propofol, morfina.
- Avaliação com neurocirurgião
- AVCH – HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA
- Ressangramento: alta mortalidade, mais comum nas primeiras 24 horas. Repouso absoluto, ansiolíticos, analgesia, laxantes, redução da PA muito elevada;
- Vasoespasmo: em geral manifesta-se entre 4º e 14º dia. Nimodipina 60 mg VO, 4/4 horas, 21 dias;
- Hidrocefalia: ocorre de forma aguda, subaguda ou tardia; uso de corticoide para reduzir processo inflamatório no espaço subaracnóideo.
ABORGADEM INICIAL NA EMERGÊNCIA
CASO CLÍNICO
MRA, masc, 66 anos, aprenta dificuldade para falar e mexer o lado do corpo direito ha meia hora com desvio de rima para esquerda. Negava cefaléia, convulsão ou outros déficits neurológicos. Tabagismo, etilismo, HAS (Losartana) e DMII (Metformina + Glicazida), Lasix e Carvedilol
180×105 mmHg, Pulso: 89 A, FR: 16ipm.
Qual o diagnóstico e quais são as metas de tempo para o atendimento inicial dele?
Resposta: O paciente foi diagnosticado com AVC isquêmico.
Com relação as metas de tempo para o atendimento inicial :
REFERÊNCIAS
2018 Guidelines for the Early Management of Patients With Acute Ischemic Stroke: A Guideline for Healthcare Professionals From the American Heart Association/American Stroke Association;
Martins, HS, Brandão, RA, Velasco, IT. Emergências Clínicas – Abordagem Prática – USP. Manole, 12ª edição, 2018;
Oliveira, CQ, Souza, CMM, Moura, CGG. Yellowbook: Fluxos e condutas da medicina interna. SANAR, 1ª ed, 2017.