Cirurgia do aparelho digestivo

Abdome Agudo Perfurativo: epidemiologia, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento

Abdome Agudo Perfurativo: epidemiologia, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento

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Abdome agudo perfurativo corresponde a um quadro de dor abdominal súbita e intensa, decorrente da perfuração de uma víscera oca, com extravasamento do seu conteúdo para a cavidade peritoneal.

A ulcera péptica perfurada corresponde a principal causa de abdome agudo perfurativo.

A infecção por Helicobacter pylori e o uso crônico de anti-inflamatórios não esteroidais (AINES) são os principais fatores de risco associados ao surgimento das úlceras na parede do estomago ou duodeno.

Outras etiologias menos frequentes são as neoplasias, ingestão de corpos estranhos, perfuração diverticular, doenças inflamatórias intestinais e infecções.

Dor Abdominal Ataque Médica - Foto gratuita no Pixabay
Imagem: Dor abdominal
Fonte: Pixabay

Epidemiologia de Abdome Agudo Perfurativo

A perfuração gastrointestinal corresponde ao terceiro tipo de abdome agudo mais comum, atrás apenas do abdome agudo inflamatório e do obstrutivo.

É uma das síndromes mais comuns de urgência abdominal não traumática e sua mortalidade pode chegar em até 10%.

A perfuração de uma úlcera péptica corresponde a principal causa de abdome agudo perfurativo, sendo que a maioria das úlceras que perfura está localizada na parede anterior do bulbo duodenal.

Fisiopatologia

A perfuração da úlcera péptica é uma complicação comumente associada ao uso crônico de anti-inflamatórios. Os AINES interferem na produção do muco do estômago, expondo a mucosa gástrica ao ácido clorídrico, predispondo a formação de lesões.

Essas lesões, quando acometem toda a espessura da parede do órgão, podem perfurar e consequentemente, o conteúdo gastrointestinal é liberado na cavidade abdominal.

Diferenças em cada caso

Quando há perfuração do trato digestivo alto, o conteúdo extravasado, composto por bile, suco pancreático e/ou suco gástrico, propicia inicialmente uma peritonite química, e a medida que a resposta inflamatória progride, pode evoluir para uma peritonite bacteriana.

Em alguns casos, o próprio momento pode tamponar a perfuração, diminuindo o processo inflamatório no abdome.

Já nas perfurações mais baixas do trato gastrointestinal, a peritonite é bacteriana desde o início, acompanhada de febre, sepse e íleo paralítico.

Nos casos das neoplasias – ou de obstruções por outras causas -, a perfuração pode ocorrer devido a invasão do tumor através da parede intestinal ou por um aumento de pressão intraluminal, que dificulta a perfusão do órgão, levando a isquemia, necrose e, posteriormente, a perfuração.

Quadro clínico de Abdome Agudo Perfurativo

O quadro clínico associado a uma perfuração gastrointestinal é tipicamente marcado por uma dor súbita, de forte intensidade. Muitas vezes, o paciente consegue identificar com precisão o momento da perfuração. Como a dor é muito intensa, os pacientes tendem a chegar no pronto socorro muito rápido.

As perfurações tamponadas pelo peritônio podem se apresentam com sinais e sintomas mais localizados, restritos a topografia da víscera acometida.

Não é raro, nessas situações, os pacientes apresentarem uma massa abdominal palpável, resultado da formação de um abscesso.

Já as perfurações em peritônio livre costumam causar uma dor mais difusa, com sinais e sintomas sistêmicos, podendo, nos casos mais graves, resultar numa infecção abdominal generalizada e sepse.

Diagnóstico de Abdome Agudo Perfurativo

O diagnóstico da perfuração gastrointestinal pode ser dado apenas com a história e com achados do exame físico. Nos casos em que o quadro clínico é inespecífico, os exames complementares devem ser solicitados para ajudar na definição do diagnóstico.

Exame físico

Durante o exame físico, à inspeção, os pacientes costumam se apresentar em posição antálgica, com pouca mobilidade e respiração curta, já que a dor piora com a movimentação.  

Na ausculta do abdome, os ruídos hidroaéreos podem estar diminuídos ou ausentes, devido ao íleo paralítico provocado pelo processo inflamatório.

A percussão pode evidenciar um timpanismo na área de macicez hepática. Esse achado é conhecido como sinal de Jobert e sugere a presença de pneumoperitôneo. Na palpação, o abdome pode apresentar uma defesa involuntária, indicando irritação peritoneal.

Avaliação adicional

Para uma avaliação adicional, radiografias de tórax e abdome com o paciente em ortostase são excelentes exames para identificar a presença gás livre na cavidade abdominal.

A radiografia de tórax pode confirmar o pneumoperitônio suspeitado no exame físico a partir da visualização de gás no quadrante superior direito, entre o fígado e o diafragma.

Já na radiografia de abdome, podemos identificar outro sinal importante, que é o sinal de Rigler. Ele corresponde a visualização da parede gástrica ou intestinal, devido a presença de gás na cavidade peritoneal.

Tratamento de Abdome Agudo Perfurativo

O tratamento vai depender da etiologia da perfuração, se a contaminação é limitada e se há sinais de sepse.

De um modo geral, o manejo clínico inicial inclui a estabilização clínica do paciente, com reposição de fluidos e antibioticoterapia de amplo espectro.

Para os pacientes com sinais de peritonite difusa e pneumoperitôneo, a exploração cirúrgica está indicada.

Nos casos de úlceras pépticas perfuradas, a cirurgia mais comum consiste na rafia da lesão, com colocação de um patch de momento para reforçar a sutura e diminuir o risco de fistulização.

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Referências:

Michael J Cahalane, MD. Overview of gastrointestinal tract perforation. UptoDate 2019. Acesso em 17 mai. 2021 https://www.uptodate.com/contents/overview-of-gastrointestinal-tract-perforation

Nimish B Vakil, MD, AGAF, FACP, FACG, FASGE. Overview of complications of peptic ulcer disease. UptoDate 2020. Acesso em 17 mai. 2021 https://www.uptodate.com/contents/overview-of-complications-of-peptic-ulcer-disease

LOPES, A. C.; REIBSCHEID, S.; SZEJNFELD, J. Abdome Agudo — Clínica e Imagem