Gastroenterologia

A esquistossomose e o método de Kato-Katz | Colunistas

A esquistossomose e o método de Kato-Katz | Colunistas

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Introdução

Neste texto, iremos abordar o método de Kato-Katz que é um dos exames laboratoriais existentes para identificação de parasitas. Este, é extremamente importante, pois tornou-se o método padrão ouro pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para o diagnóstico da infecção causada pelo parasita chamado Schistosoma mansoni, agente da doença esquistossomose.

Provavelmente, você já deve ter estudado sobre esta doença no ensino médio e logo depois no curso de medicina nas aulas de Parasitologia. Aqui, vamos, portanto, te relembrar sobre as características gerais dessa doença e o que é, como é realizado e o impacto social desse método de Kato-Katz.

Figura 1. Schistosoma mansoni.
Fonte: http://www.cdipd.org/index.php/our-schistosomiasis-research.

As parasitoses no Brasil

As parasitoses no Brasil são consideradas doenças negligenciadas, pois há muita desinformação sobre elas, e os métodos de prevenção são simples, baratos, mas pouco discutidos, ensinados e mal praticados.

Além da desinformação, fatores como clima quente e úmido, más condições socioeconômicas e sanitárias tornam esse problema ainda mais comum no nosso país.

Entre os exemplos mais comuns de parasitoses, podemos mencionar: amebíase, ancilostomose, ascaridíase, tricuríase, enterobíase, estrongiloidíase, giardíase,  teníase e a esquistossomose (que veremos a seguir).           

Esquistossomose

Agente etiológico

A esquistossomose, como já foi dito, é a doença causada pelo Schistosoma mansoni. Este, é da classe Trematoda, filo dos Platelmintos e apresenta algumas características importantes: vermes foliáceos, não segmentados e que apresentam ventosas.

As ventosas possibilitam esses vermes de fixar na parede dos vasos sanguíneos, onde eles se alimentam dos nutrientes que passam por esse local.

Este agente, apresenta acentuado dimorfismo sexual, o macho e a fêmea são facilmente identificados em uma microscopia eletrônica. Normalmente encontrados juntos, o macho é mais volumoso e de menor comprimento (0,6 -1,2 cm) e a fêmea é delgada e comprida (0,7-1,7 cm).

Figura 2. Macho e fêmea, Schistosoma mansoni, microscopia eletrônica.
Fonte: https://agencia.fiocruz.br/estudo-cl%C3%ADnico-investigou-uso-de-maiores-dosagens-contra-a-esquistossomose.

Ciclo de vida/reprodutivo

O ciclo de vida desse parasita (Figura 3) inicia-se com o acasalamento entre o macho e fêmea nos ramos do sistema venoso porta. As fêmeas fecundadas migram para as veias mesentéricas do sigmóide e reto,  onde começam a postura de ovos, liberando quase mil ovos por dia. Em menos de uma semana, parte desses ovos tornam-se maduros e atravessam os capilares, caindo no lúmen intestinal, sendo eliminados para o meio ambiente juntamente com as fezes. Já a outra parte permanece nos vasos do sistema portal.

Nesta etapa, há a necessidade do contato com água (normalmente, em córregos e lagoas), pois o miracídio ciliado (embrião liberado pelo ovo na água) nada ativamente para encontrar o molusco do gênero Biomphalaria. O miracídio pode permanecer vivo apenas por algumas horas sem o molusco.

Por conseguinte, o miracídio penetra no tegumento desse molusco, tornando-se o esporocisto primário.  Em seguida, essas células germinativas dão origem a quatro esporocistos secundários, que vão se transformar em larvas cercárias.

De 20 a 30 dias, após a penetração do miracídio, o molusco elimina as cercárias na água, permanecendo vivas em até dois dias.

Essas cercárias possuem uma estrutura na calda que as permite penetrar na pele do ser humano. A contaminação ocorre, então, com o contato do ser humano em águas infestadas com cercárias e esses moluscos.

Após a entrada das cercárias, elas perdem as caudas e tornam-se esquistossômulos, que penetram na corrente sanguínea, passando pelos capilares, pulmões, coração, até chegarem aos vasos mesentéricos onde iniciam o processo de amadurecimento novamente, fechando o ciclo desse organismo.

Figura 3.Ciclo da Esquistossomose.
Fonte: https://www.todamateria.com.br/esquistossomose/.

Principais sintomas

Os principais sintomas são divididos em duas fases: aguda e crônica.

Os sintomas da fase aguda (primeiros dois meses) são:

  • Dermatite cercariana (provocada pela penetração da larva na pele);
  • Febre de Katayama (4 a 8 semanas);
  • Eosinofilia;
  • Náuseas;
  • Perda de peso;
  • Diarreia.

Já os sintomas da fase crônica (após anos de contaminação) dependem da disposição imunológica, quantidade de larvas e o local, são eles:

  • Hepatomegalia (normalmente, o fígado é o órgão mais comprometido);
  • Esplenomegalia;
  • Diarreia;
  • Fezes sanguinolentas.

Área endêmica

A área endêmica brasileira da esquistossomose pode ser representada por uma faixa que contempla o norte de Minas Gerais, passando pelo litoral nordestino na Bahia até o Paraíba. Existindo locais com focos isolados em cidades menores no estado do Rio de Janeiro e São Paulo.

Figura 4. Número percentual de casos positivos por esquistossomose mansoni, por Unidade da Federação (UF) de 2008 a 2016.

Fonte: SISPCE/CGHDE/DEVIT/SVS/MS.

Tratamento e prevenção

O tratamento dessa doença vai desde anti-histamínicos locais e corticosteroides tópicos para a dermatite cercariana, até uso de antitérmicos, analgésicos e antiespasmódicos para o controle dos sintomas. Mas, o tratamento específico é feito com Praziquantel e Oxaminiquine.

No caso da prevenção dessa doença, o mais eficaz são melhorias no saneamento básico e tratamento dos doentes. Além de não entrar, ou nadar, em lagoas (chamadas também de lagoas de coceiras), córregos, riachos sem qualquer tipo de fiscalização e sem qualquer tipo de proteção.

Ainda não há uma vacina contra essa parasitose, mas em alguns anos, há possibilidade de uma com os avanços nos estudos de pesquisadores brasileiros da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Método de Kato-Katz

O que é?

Como já foi dito, o método de Kato-Katz é um método laboratorial, utilizado como padrão ouro para o diagnóstico da esquistossomose, pelo alto grau de sensibilidade para esse parasita. Basicamente, é um método quantitativo, que calcula a quantidade de ovos eliminados pelas fezes.

Como é feito?

Materiais necessários: kits Kato-Katz, microscópio binocular, máscara, avental e lâminas de vidro.

Como limitação do exame, as fezes devem estar frescas (tempo menor de 48 horas), não liquefeitas (diarreicas). Não há a necessidade de outro equipamento de visualização sem ser o microscópio comum, os ovos são grandes com boa visualização. Profissionais experientes conseguem realizar todo o procedimento em menos de 3 horas.

Passo a passo da técnica:

  1. Preparar um pequena quantidade de fezes em papel higiênico;
  2. Comprimir essa porção de fezes com a tela de metal (do kit); apenas os ovos dos helmintos e detritos menos passaram pela malha;
  3. Retirar as fezes que passaram pela tela e com o auxílio do coletor, passe para a um cartão retangular do kit (que possui um orifício de 6 mm de diâmetro onde as fezes serão colocadas). Este será colocado em uma lâmina comum de microscopia;
  4. Após preencher completamente o orifício, retire o cartão com cuidado, deixando as fezes na lâmina de vidro;
  5. Cobrir as fezes com celofane impregnado com verde malaquita (kit), pressionando a lâmina, depois de invertida, contra uma folha de papel absorvente;
  6. Aguardar 1 a 2 horas, examine no microscópio todos os campos;
  7. O número de ovos encontrados no esfregaço fecal deve ser multiplicado pela constante 24 para obter o número de ovos por grama de fezes.

Dentre as diversas qualidades dessa forma diagnóstica estão a velocidade e o baixo custo do exame.

Conclusão

Após a leitura do artigo, é possível entender como funciona o método de Kato-Katz e sua importância na prática médica, além de relembrar sobre o parasita, desde o ciclo de vida até o tratamento da infecção causada pelo Schistosoma mansoni.

Lembrando que as verminoses são problemas ligados a más condições socioeconômicas e desinformação da população, logo vê-se uma das muitas responsabilidades do profissional da área da saúde: a de educador.

Por fim, exaltamos os pesquisadores brasileiros que, com muita dedicação, proporcionaram grandes avanços e lideram na produção de vacina contra as parasitoses. Futuramente e certamente salvarão milhões de vidas em todo o mundo!

O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: esse material foi produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido.


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Referências:

Quais são as parasitoses intestinais mais comuns? – https://cuidadospelavida.com.br/cuidados-e-bem-estar/problemas-digestivos/parasitoses-intestinais-mais-comuns

Você conhece o objetivo do exame parasitológico? – https://www.laboratoriocarloschagas.com.br/noticias/voce-conhece-o-objetivo-do-exame-parasitologico/#:~:text=O%20exame%20parasitol%C3%B3gico%20%C3%A9%20um,vivos%20%C3%A9%20procurada%20e%20estudada.

Parasitologia – http://www.juventudect.fiocruz.br/parasitologia

Controle de qualidade das lâminas pelo método Kato-Katz para o diagnóstico parasitológico da esquistossomose mansônica – https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1676-24442017000200110&script=sci_abstract&tlng=pt

Estudo comparativo dos métodos coprológicos de Lutz, Kato-Katz e Faust modificado – https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-89101979000400010#:~:text=M%C3%A9todo%20de%20Kato%2DKatz%20%E2%80%94%20Consiste,passe%20atrav%C3%A9s%20de%20suas%20malhas.

Protozoários – https://www.todamateria.com.br/protozoarios/

Platelmintos – https://brasilescola.uol.com.br/biologia/platelmintos.htm

Boletim epidemiológico 49 – http://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2018/novembro/19/2018-032.pdf

Estudo clínico investigou uso de maiores dosagens contra a esquistossomose – https://agencia.fiocruz.br/estudo-cl%C3%ADnico-investigou-uso-de-maiores-dosagens-contra-a-esquistossomose

Esquistossomose – https://www.todamateria.com.br/esquistossomose/

Our Schistosomiasis Research – http://www.cdipd.org/index.php/our-schistosomiasis-research