Biologia molecular e celular

Desidrogenase láctica: qual a sua importância? | Colunistas

Desidrogenase láctica: qual a sua importância? | Colunistas

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Imagem de perfil de Gabriela Saldes Pereira

A desidrogenase láctica é também chamada de lactato desidrogenase, LDH e DHL. Esta enzima é muito utilizada para análise laboratorial de diversos pacientes.

Portanto, é de suma importância a compreensão sobre o papel desta, por que seus valores laboratoriais e o significado deste resultado podem ser alterados, sendo estes tópicos abordados no texto abaixo.

O que é a desidrogenase láctica?

Em casos de anaerobiose, o piruvato oriundo da glicólise pode sofrer fermentação láctica, visando à produção de energia na ausência de oxigênio. Assim, por meio desta via glicolítica, o piruvato é transformado em lactato, sendo esta reação catalisada pela enzima desidrogenase láctica (LDH), como ilustrado pela reação abaixo.

Devemos ressaltar que nas hemácias, células sem mitocôndrias e que, portanto, não podem realizar oxidação de piruvato até a formação de dióxido de carbono, a produção de ATP é realizada sempre via fermentação láctica, mesmo em regimes de aerobiose.

Fonte: http://rmct.ime.eb.br/arquivos/RMCT_3_tri_2011/RMCT_097_E5A_12.pdf

Quais são as isoformas da LDH e qual a diferença entre elas?

A enzima LDH está presente no meio intracelular de diversas células em diversos tecidos e órgãos e é constituída por quatro subunidades proteicas – as mais encontradas sendo LDH-M e LDH-H –, sendo, assim, considerada um tetrâmero.

Este tetrâmero pode originar cinco isoformas enzimáticas: HHHH (4H), MMMM (4M), HMMM (1H3M), HHMM (2H2M), HHHM (3H1M), sendo cada uma delas mais presente em um tipo específico de tecido, embora possuam atividade enzimática semelhante. 

Sabemos que a isoforma 4M é mais presente em tecido muscular esquelético e no fígado, enquanto a isoforma 4H é mais presente em tecido muscular cardíaco e tecido cerebral, por exemplo, sendo estas isoformas mais relevantes.

Por que seu valor pode ser alterado em exames laboratoriais?

Pelo fato de a LDH ser encontrada em diversas células no meio intraplasmático, notamos aumento de seu nível quando existe lesão celular, de forma que esta enzima é liberada na corrente sanguínea, se tornando detectável em exames laboratoriais séricos. Portanto, o aumento do nível sérico total desta enzima indica lesão tecidual, porém, como dito anteriormente, a desidrogenase láctica está dispersa por diversos tecidos, o que torna seu uso pouco específico.

Para contornar a baixa especificidade deste resultado, podemos investigar os níveis séricos de suas isoformas, buscando definir com mais certeza o local de lesão que origina a elevação dos valores laboratoriais encontrados.

Um exemplo é a presença de aumento sérico total de LDH em quadros de IAM, nos quais é esperado aumento da isoforma 4H, também denominada LDH-1, por causa de danos às células musculares cardíacas.

Marcadores bioquímicos e o IAM

            Em casos de IAM, é sabido que diversos marcadores bioquímicos podem ser empregados para diagnóstico deste quadro, dentre eles temos as troponinas, creatina-quinase, mioglobina e, por fim, a lactato desidrogenase.

            Por conta da lesão de cardiomiócitos em decorrência da isquemia e necrose miocárdica encontrada nos IAMs e até mesmo em quadros de angina, ocorre a liberação de LDH na corrente sanguínea, elevando seus níveis séricos em 82 a 100% dos casos.

Como dito anteriormente, é valido ressaltar que a isoforma desta enzima que se encontrará mais elevada é a LSH-1, dado que é a mais presente nas células danificadas neste quadro. É importante salientar que este biomarcador passa a se elevar 12 a 16 horas após o evento, possuindo pico sérico após cerca de 48 horas e permanece elevada por 10 a 12 dias.

Cinética da LDH na necrose miocárdica. Fonte: https://www.portalesmedicos.com/publicaciones/articles/715/2/Marcadores-sericos-bioquimicos-cardiacos.-Creatinfosfoquinasa-serica-total-%28CPK%2C-creatinquinasa-%28CK%29-total%29.-Lactodeshidrogenasa-%28LDH%29.-Glutamico-oxalacetico-transaminasa-%28GOT%2C-AST%29

No entanto, não possui alta especificidade para a lesão miocárdica, assim não sendo o marcador mais empregado na prática médica, como visto na tabela abaixo.

Sensibilidade clínica estimada dos marcadores de isquemia miocárdica, levando-se em conta o tempo após o início da dor precordial. Fonte: https://www.fleury.com.br/medico/artigos-cientificos/marcadores-bioquimicos-de-lesao-cardiaca

LDH e COVID-19

            Atualmente, com a pandemia causada pelo vírus SARS-Cov-2, diversos marcadores laboratoriais são explorados para diagnóstico e acompanhamento dos pacientes com a infecção causada por este micro-organismo, a COVID-19. Sabemos que esta patologia possui transmissão por meio de contato com secreções respiratórias contaminadas, como gotículas liberadas por tosse, espirros e fala, além de que se manifesta, principalmente, de forma respiratória, dado que possui como principal alvo células epiteliais nasais e brônquicas, bem como pneumócitos.     

            A partir destas informações, é sabido que a infecção por este coronavírus desencadeia, além das demais reações, dano às células pulmonares, levando a diversas alterações laboratoriais. Uma das alterações bioquímicas é o aumento dos níveis de LDH, notada em 41% dos pacientes, sendo um marcador não apenas de lesão pulmonar, mas de falência de demais órgãos afetados pela infecção e suas consequências, como a tempestade de citocinas encontrada na fisiopatologia da doença.

Vale ressaltar também que, de acordo com uma matéria publicada no site NewsLab, pacientes internados em UTI por COVID-19 possuem níveis de LDH 2,1 vezes maiores que pacientes não internados sob cuidados intensivos com o mesmo diagnóstico, indicando assim gravidade da doença.

            A partir destes dados, notamos a relevância deste marcador bioquímico no acompanhamento e prognóstico de pacientes diagnosticados com COVID-19 durante a pandemia que vivemos desde o início de 2020.

Conclusão

           Resumidamente, a LDH é a enzima responsável por catalisar a reação de oxidação de piruvato em lactato em casos de anaerobiose e se distribui dor diversos tecidos, possuindo relevância clínica na detecção de lesões teciduais. Ademais, destaca-se que a análise laboratorial dos níveis séricos desta enzima em sua modalidade total é pouco específica, podendo se tornar mais específica por meio da análise sérica de suas isoformas, permitindo identificação mais detalhada do tecido.

Autora: Gabriela Saldes Campos Pereira

Estudante de Medicina do 7o semestre da PUC Campinas

Instagram: @gabisaldes

O texto acima é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

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Referências

https://www.gov.br/pt-br/servicos-estaduais/exame-laboratorial-dosagem-de-desidrogenase-latica

https://www.ufrgs.br/lacvet/site/wp-content/uploads/2020/11/funcao_muscular.pdf

Nelson, David L. Princípios de bioquímica de Lehninger [recurso eletrônico]/ David L. Nelson, Michael M. Cox; [tradução: Ana Beatriz Gorini da Veiga… et al.]; revisão técnica: Carlos Termignoni… [et al.]. – 6. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre: Artmed, 2014.

https://alagoasdigital.al.gov.br/servico/5e2f2e83547bb3543b97ca00/exame-laboratorial-dosagem-de-desidrogenase-latica#oquee

https://www.leaclab.com.br/kits-elisa-e-colorimetricos/bioquimica-do-sangue-e-urina-colorimetrico/atividade-de-lactato-desidrogenase-ldh-kit-colorimetrico

http://rmct.ime.eb.br/arquivos/RMCT_3_tri_2011/RMCT_097_E5A_12.pdf

https://bdtd.inpa.gov.br/bitstream/tede/1617/2/Disserta%C3%A7%C3%A3o_%20Luciana%20Mara%20Lopes%20F%C3%A9.pdf

http://www.invitro.com.br/ldh.php

https://fenad.org.br/covid-19-fisiopatologia-transmissao-diagnostico-e-tratamento-da-doenca-de-coronavirus-2019-uma-revisao/#:~:text=Nos%20est%C3%A1gios%20posteriores%20da%20infec%C3%A7%C3%A3o,influxo%20de%20mon%C3%B3citos%20e%20neutr%C3%B3filos.

https://newslab.com.br/alteracoes-laboratoriais-mais-frequentes-em-pacientes-com-covid-19/