Ciclo Clínico

Desvendando a Hidrocefalia!

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A hidrocefalia corresponde ao acúmulo excessivo de líquido cefalorraquidiano (LCR) dentro do sistema ventricular, levando a dilatação do mesmo. A incidência de hidrocefalia congênita vem aumentando ao longo dos anos, o que na verdade reflete maior número de notificações e diagnósticos precoce durante o pré-natal.

A hidrocefalia primária sem espinha bífida acomete 1 em cada 2500 nascidos vivos. Nos últimos 25 anos, houve uma redução significativa na incidência da hidrocefalia, passando de 54% para 5%. Ademais, quanto a redução da capacidade cognitiva, associada com casos crônicos de hidrocefalia, houve uma redução de 62% para 30%.

Já as hidrocefalias secundárias são comuns na evolução de certas patologias do sistema nervoso central, tais como: encefalopatias, meningoencefalites, hemorragia subaracnóidea, perda do parênquima (AVC e doenças degenerativas) e obstrução no sistema ventricular (neurocisticercose e tumores).

Qual a fisiopatologia da hidrocefalia?

O LCR é formado no plexo coroide e circula pelos ventrículos e espaço subaracnoide, sendo reabsorvido para a circulação venosa sistêmica pelas granulações aracnoideas. O desequilíbrio entre a entrada e saída do liquor resulta em hidrocefalia.

Os fatores envolvidos no desequilíbrio do sistema ventricular são:

  • Obstrução do sistema ventricular: malformações congênitas, neurocisticercose, hemorragia ventricular, tumores
  • Absorção prejudicada: meningite, hemorragia subaracnóidea e ventricular, congestão venosa
  • Superprodução (rara): papiloma do plexo coroide

A fisiopatologia da hidrocefalia depende da sua causa subjacente, podendo ser dividida em 4 grupos:

  1. Não-comunicante: possui uma retenção do LCR acima de onde está a obstrução, não sendo homogênea a dilatação ventricular. Na infância, quando ainda não há fusão das suturas, pode resultar no aumento acentuado da cabeça, quando o crânio se expande para diminuir a pressão intracraniana (PIC).
  2. Comunicante: a absorção liquórica está diminuída por uma irritação nas granulações aracnoideas, secundária a hemorragia ou processo infeccioso, e todo o sistema ventricular está dilatado.
  3. De pressão normal: pode ser idiopática ou secundária as causas que reduzem a absorção liquórica, semelhante a hidrocefalia comunicante.
  4. Ex-vacuum: a hidrocefalia é um processo compensatório, no qual irá ocupar locais onde há perda do parênquima.

Sinais e sintomas

As hidrocefalias que possuem aumento da PIC (não-comunicantes e comunicantes), apresentam quadro clínico de hipertensão intracraniana:

  • Vômito
  • Cefaleia
  • Coma
  • Papiledema

Atenção: Não podemos esquecer dos sinais de herniação cerebral, que são anisocoria, hemiparesia ipsilateral e a tríade de Cushing (hipertensão, bradicardia e alteração respiratória).

A hidrocefalia de pressão normal (HPN), possui uma tríade clínica clássica:

  • Demência
  • Distúrbios da marcha (ataxia e parkinsonismo)
  • Incontinência urinária

Como é feito o diagnostico da hidrocefalia?

O diagnóstico é clínico, exceto na hidrocefalia ex-vacuum.

  • A tomografia de crânio é necessária para confirmação diagnóstica, sendo um método que muitas vezes revela a etiologia da hidrocefalia e avalia o quadro clínico, principalmente o risco de herniação naqueles pacientes que serão puncionados.
  • A punção liquórica é utilizada para confirmar a etiologia e diagnosticá-la quando não é possível na TC. Na análise do líquor, são utilizados os parâmetros de glicose, proteína, coloração e total de células

Durante o acompanhamento pré-natal, a ultrassonografia é capaz de mostrar hidrocefalias congênitas.

Tratamento com abordagem não-cirúrgica

Hidrocefalia com aumento da pressão intracraniana: é uma emergência e a abordagem inicial inclui oferta de oxigênio, monitorização cardíaca, respiratória e pressórica. Os sinais de urgência são:

  • História que sugere HIC (trauma, hemorragia subaracnóidea e cefaleia intensa diferente do padrão habitual.
  • Exame físico que sugere HIC
  • Escala de coma de Glasgow ≤ 8
  • Causas reversíveis: sinais de intoxicação, hipoxemia (PaO₂ ≤ 60 mmHg), hipotermia (≤ 35oC)

Medidas importantes de serem realizadas em casos de hidrocefalia

  • Manitol intravenoso e solução salina hipertônicas: são utilizadas para redução da PIC devido a diminuição a quantidade de liquor por osmose.
  • Elevação da cabeceira a 30oC, para aumentar o retorno venoso por ação da gravidade.
  • Hiperventilação para manter PCO2 entre 35 e 45 mmHg faz com que haja uma vasoconstricção cerebral com consequente redução do fluxo sanguíneo. Valores entre 25 e 30 mmHg são aceitáveis por momentos breves, devido ao risco de isquemia.
  • Sedação e analgesia para evitar dor e agitação, sendo midazolam, fentanil e morfina são utilizados com frequência. O uso de lidocaína 1mg/kg IV antes da intubação orotraqueal evita o aumento da PIC.
  • Monitorização da glicemia para evitar valores hiperglicemia > 180 mg/dl e hipoglicemia < 70 mg/dl.
  • Crises convulsivas devem ser tratadas somente se ocorrem, não sendo recomendado tratamento profilático.

Tratamento com abordagem cirúrgica

A hidrocefalia é tratada majoritariamente através da drenagem ventricular externa ou ventriculoperitoneal, que reduz o volume liquórico de forma efetiva.

Já em casos de trauma, a craniectomia descompressiva é bastante utilizada, aliviando a HIC com a retirada de uma parte do crânio, ampliando o espaço intracraniano e reduzindo a PIC.

Referências bibliográficas

  1. Diedler J, Sykora M, Blatow M, Jüttler E, Unterberg A, Hacke W. Decompressive surgery for severe brain edema. Arq enterol J Intensive Care Med. 2009;24(3):168.
  2. Katia M, Tânia R, Cláudia L, Jorge J. Treatment of intracranial hypertension. J. Pediatr. (Rio J.) vol.79 no.4 Porto Alegre July/Aug. 2003
  3. Longo, DL et al. Harrison’s Principles of Internal Medicine. 19th ed. New York: McGraw-Hill, 2015.
  4. Goldman, L.; Schafer, AI. Goldman’s Cecil Medicine. 25th ed. Philadelphia: Elsevier Saunders, 2016.
  5. Kumar V, Abbas A, Aster J. Robbins patologia básica. 9th ed. Elsevier, 2013.

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