A Hemorragia Digestiva engloba qualquer sangramento que ocorra no trato gastrointestinal. É classificada entre hemorragia digestiva alta e hemorragia digestiva baixa, conforme a sua localização em relação ao ligamento de Treitz.
Vamos abordá-las como duas patologias separadas, tanto para fins didáticos, como devido ao fato de cursarem com diferentes sintomas, complicações e morbimortalidade.
Hemorragia Digestiva Alta (HDA)
A hemorragia digestiva alta (HDA) é definida como um sangramento decorrente de uma lesão proximal ao ligamento de Treitz, envolvendo o esôfago, estômago ou duodeno.
Possui morbidade e mortalidade de 40% e 10%, respectivamente e, em nosso meio, tem como as causas mais comuns as lesões agudas erosivas da mucosa gastroduodenal e a doença ulcerosa péptica. Frequentemente, também se observa sangramento secundário a rotura de varizes gastroesofágicas.
A esofagite erosiva, a lesão de Mallory-Weiss (laceração hemorrágica da transição esofagogástrica induzida por esforços de vômito), a gastropatia congestiva, a ectasia vascular antral e a lesão de Dieulafoi (exulceratio simplex) são responsáveis por menos de 10% das causas de HDA.
SE LIGA NO CONCEITO! A hemorragia digestiva alta (HDA) é definida como um sangramento decorrente de uma lesão proximal ao ligamento de Treitz.
A hemorragia digestiva alta tem incidência de 48 a 160 casos por 100.000 adultos/ano e é responsável por 1 internação a cada 10.000 adultos. Além disso, ocorre duas vezes mais em homens do que em mulheres.
Etiologia e patologia da Hemorragia Digestiva Alta
O sangramento de úlceras pépticas compõem de 36% a 38% das hemorragias digestivas altas. Tratam-se de erosões na mucosa, acometendo principalmente o fundo e o corpo gástricos, podendo eventualmente acometer o antro também.
Dentre os fatores de risco, encontram-se o uso de aspirina, infecção pelo Helicobacter pylori e uso de anti-inflamatórios não-esteroidais (AINEs). Situações de estresse, como sepse ou choque, também podem contribuir para a sua ocorrência. Dentre pacientes internados na UTI, 1,5% desenvolve sangramento de úlcera de estresse.
A síndrome de Mallory-Weiss, caracterizada por laceração da junção esofagogástrica devido a esforços repetitivos de vômito, ocorre quando a lesão envolve o plexo venoso ou arterial esofágico subjacente. Ocorre principalmente em elitistas e gestantes e costuma cessar de forma espontânea.
A angiodisplasia do trato gastrointestinal (TGI) alto se caracteriza por má formação arteriovenosa, teleangiectasias e ecstasias vasculares. Raramente causa sangramento intestinal agudo que faz o paciente apresentar-se ao pronto-socorro, limitando-se geralmente a sangramento de pequena intensidade.
Neoplasias do TGI compõem apenas 3% das causas de HDA, podendo ser benignas ou malignas, primárias ou metastáticas. O sangramento não costuma ser grave.
A lesão de Dieulafoy é caracterizada por um vaso submucoso aberrante dilatado que pode erodir a camada epitelial adjacente na ausência de lesão ulcerosa. O sangramento é recorrente e pode se associar a diversas endoscopias sem diagnóstico.
Fístula aortoentérica deve ser suspeitada em paciente com histórico de cirurgia de aneurisma de aorta, úlcera penetrante, invasão tumoral, trauma, radioterapia e perfuração por corpo estranho. O sangramento é intenso.
O sangramento gastrointestinal também pode resultar do sistema biliar e ductos pancreáticos.
As varizes esofágicas, uma das principais causas de HDA, estão presentes em 50% dos pacientes com cirrose hepática ao diagnóstico. Dentre os pacientes cirróticos, um terço terá hemorragia varicosa, sendo que casos de cirrose mais avançada (classificação de Child-Pugh B ou C) têm taxa mais elevada de sangramento.
Já entre pacientes cirróticos sem varizes, a taxa de aparecimento anual é de 7%, sendo 12% a incidência anual de sangramento.
O risco de hemorragia se correlaciona com o seu tamanho, o grau de disfunção hepática e a presença de manchas vermelhas ou “red spots”. Varizes associadas a hipertensão portal e cirrose representam 15% dos casos de HDA e a taxa de hemorragia varicosa recorrente é de 60% em um ano, com mortalidade de 15% a 20% a cada episódio de hemorragia, variando desde 0% em pacientes Child-Pugh até 30% em pacientes Child-Pugh C.
As varizes gastroesofágicas resultam diretamente da hipertensão portal, devido ao aumento da resistência ao fluxo ou ao aumento do fluxo sanguíneo na veia porta. A resistência ao fluxo pode ocorrer pela destruição da arquitetura hepática, como consequência da fibrose, do aumento do tônus vascular por disfunção endotelial e diminuição da disponibilidade de óxido nítrico.
A formação de varizes gera descompensação do sistema venoso porta, transportando sangue para a circulação sistêmica. A formação de varizes ocorre quando o gradiente venoso portal supera cerca de 10mmHg. Esse processo se associa a fatores angiogênicos, com formação de colaterais porto-sistêmicas e portal-venosa, aumentando fluxo sanguíneo devido a vasodilatação esplênica e aumento do débito cardíaco. Por fim, o crescimento das varizes é influenciado pelo aumento da pressão e do fluxo da circulação portal.

Imagem: Vascularização venosa com alterações de pressão. Fonte: https://www.hindawi.com/journals/hpb/2013/129396/fig12/.
Principais etiologias da HDA
- Doença Ulcerosa Péptica
- Varizes gastroesofágicas
- Mallory-Weiss
- Úlceras de estresse
- Gastropatia portal hipertensiva
- Esofagite
- Lesão de Dieulafoy
- Angiodisplasia e Teleangiectasia
- Ectasia vascular gástrica
- Fístula Aortoentérica
- Doença de Crohn