Índice
- 1 Hipotireoidismo descompensado: o que é dose excessiva de levotiroxina?
- 2 Quais as condições que devemos investigar diante de pacientes que estejam necessitando de doses altas de levotiroxina?
- 3 Como avaliar a má adesão?
- 4 Hipotireoidismo descompensado: sugestão de leitura complementar
- 5 Referências do artigo
Confira na coluna do Dr. Alexandre Câmara tudo que o médico precisa para conduzir pacientes tratados com hipotireoidismo descompensado!
Frequentemente, nos deparamos com pacientes que estão tomando doses altas de levotiroxina, mas ainda assim não conseguem manter o TSH sérico dentro da faixa de referência normal (aproximadamente 0,5 a 5,0 mU/L).
Se esse for o seu caso também, você está certo, pois quase 40% das pessoas que têm hipotireoidismo não atingem o alvo terapêutico, ou seja, não estão com o tratamento adequado. Portanto, o que fazer nestas situações? Trazer respostas para essa pergunta é o objetivo da coluna de hoje.
Hipotireoidismo descompensado: o que é dose excessiva de levotiroxina?
Esta não é uma pergunta simples, a literatura não é clara em definir a partir de qual dose devemos nos “preocupar” em investigar que tem algo errado com o tratamento.
Mesmo sabendo que não existe dose máxima levotiroxina, a dose média é de 1,6-1,8 mcg/kg em pacientes jovens e saudáveis e com hipotireoidismo clínico, sendo que 95% destes pacientes controlam com doses de até 2,1 mcg/kg/dia.
No entanto, as diretrizes atuais recomendam uma dosagem de levotiroxina de 1,6 mcg por kg por dia com base no peso corporal ideal em vez do peso corporal real.
O peso corporal ideal pode ser calculado como o peso para a altura que geraria um índice de massa corporal de 24 a 25 kg por m2. A massa corporal magra é um melhor preditor da necessidade de dosagem do que o peso corporal real.
Dose média de levotiroxina para cada faixa de IMC
Na tabela 01 trazemos a dose média de levotiroxina para cada faixa de IMC – acima de 25% da dose média devemos avaliar baixa adesão, má absorção ou mesmo alguma condição que esteja aumentando a necessidade de hormônio tireoidiano.
Tabela 01: Dose média de levotiroxina vs. IMC

Quais as condições que devemos investigar diante de pacientes que estejam necessitando de doses altas de levotiroxina?
Depois de definirmos se realmente a dose de levotiroxina está alta, vamos aos próximos passos da investigação.
O primeiro ponto é avaliar se a absorção é adequada. Para facilitar a absorção, a levotiroxina deve ser tomada 30-45 minutos antes do café da manhã e pelo menos 3 horas após a última refeição.
Além disso, é importante avaliar se o paciente está usando suplementos minerais como ferro, cálcio, magnésio, os quais afetam a absorção de levotiroxina.
A falta do ambiente ácido também pode interferir na absorção, sendo assim a gastrectomia (total ou parcial) e outros medicamentos comumente usados, como os inibidores da bomba de prótons e hidróxido de alumínio, também têm um impacto negativo na absorção da levotiroxina.
Adicionalmente, é fundamental investigar se o paciente tem alterações em jejuno — local da absorção da medicação. As mais frequentes são:
- síndrome do intestino curto,
- by-pass intestinal,
- doença celíaca,
- doença inflamatória intestinal.
Também existem situações que podem aumentar a demanda do organismo pelo hormônio tireoidiano, tais como gravidez, síndrome nefrótica e uso de algumas medicações como: sertralina, fenitoína, carbamazepina, rifampicina, fenobarbital, combinação de medicamentos antivirais com ritonavir.
Uma outra questão para abordar ao paciente é se ele está mantendo a marca de levotiroxina. A bioequivalência entre as marcas é semelhante, mas a biodisponibilidade pode mudar. Alterar constantemente a marca pode dificultar o controle do hipotireoidismo.
O que fazer em caso de não encontrar uma causa?
Se na avaliação clínica não for encontrado nenhum dos fatores acima, sugerimos realizar a avaliação através de exames complementares (principalmente endoscopia digestiva alta) dos distúrbios gastrointestinais, como gastrite relacionada a H. pylori, gastrite atrófica ou doença celíaca.
Caso seja evidenciado alguma destas condições (resumidas na tabela 2), é esperado que a dose seja realmente “mais alta que a média”.
Além disso, caso não seja possível retirar a medicação ou situação clínica, pode ser necessário aumentar ainda mais a levotiroxina para atingir o alvo do TSH. Mas lembre-se que se alguma destas medicações forem excluídas da prescrição, recomenda-se a reavaliação da função tireoidiana e da dosagem de levotiroxina.
Principais fatores interferentes na dose de levotiroxina

Como avaliar a má adesão?
Ocasionalmente, mesmo diante de toda a investigação não encontraremos nenhuma explicação para a dose prescrita ser tão alta e o paciente insistirá que está tomando levotiroxina, mas o TSH estará bastante alto.
Caso na história clínica não ficar claro sobre o uso inadequado, pode ser feito o “teste de absorção da levotiroxina”, que consiste na aferição do T4 total, basal e após administração de 1.000 mcg de levotiroxina nos tempos 60, 120, 180, 240 e 300 minutos.
Um incremento no teste acima de 60 % em relação ao basal favorece má adesão, se incremento menor que 60%, fala a favor de má absorção.
Uma sugestão para facilitar a aderência é orientar que se o paciente esquecer da medicação em algum dia, tomar o dobro da dose no dia seguinte – não é a situação ideal, mas lembre-se que a meia-vida plasmática da levotiroxina é de 07 dias – o tratamento uma vez ao dia tem o objetivo de manter concentrações séricas quase constantes.
Caso mantenha a dificuldade no controle, uma alternativa é usar uma dose semanal supervisionada de 7x 1,6 mcg/kg /semana. No algoritmo 01 compilamos as principais etapas da investigação.
Algoritmo 01: avaliação de pacientes em uso de doses altas de levotiroxina

Hipotireoidismo descompensado: sugestão de leitura complementar
- Hipotireoidismo na gestação: avaliação da função tireoidiana, diagnóstico e tratamento
- Resumo de Hipotireoidismo | Ligas
- Hipotireoidismo no idoso: implicações no diagnóstico e o tratamento
Que tal aproveitar para se aprofundar em outro tópico além do hipotireoidismo descompensado? Assista o podcast SanarCast que fala sobre os novos tratamentos da insulina.
Referências do artigo
- Bornschein A, Paz-Filho G, Graf H, Carvalho GA de. Treating primary hypothyroidism with weekly doses of levothyroxine: a randomized, single-blind, crossover study. Arq Bras Endocrinol Metab. 201 2Jun;56(Arq Bras Endocrinol Metab, 2012 56(4)):250–8.
- Using body mass index to predict optimal thyroid dosing after thyroidectomy. Ojomo KA, Schneider DF, Reiher AE, Lai N, Schaefer S, Chen H, Sippel RS. https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1072751512013786. J Am Coll Surg. 2013;216:454–460
- Chaker L, Bianco AC, Jonklaas J, Peeters RP. Hypothyroidism. Lancet. 2017 Sep 23;390(10101):1550-1562. doi: 10.1016/S0140-6736(17)30703-1. Epub 2017 Mar 20.
- Patil N, Rehman A, Jialal I. Hypothyroidism. [Updated 2022 Aug 8]. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2023 Jan-. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK519536/
- Douglas S Ross. Treatment of primary hypothyroidism in adults . UpToDate 2023. https://www.uptodate.com/contents/treatment-of-primary-hypothyroidism-in-adults