Índice
- 1 O que é a tirzepatida?
- 2 Mas o que há de diferente no Mounjaro? e por que é considerado uma revolução no tratamento do paciente metabólico?
- 3 6. Impacto na Massa Óssea:
- 4 Quais as principais contraindicações e precauções da tirzepatida?
- 5 Como deve ser prescrita e utilizada o Mounjaro?
- 6 Mensagens chave
- 7 Sugestão de leitura complementar
- 8 Referências
Confira o artigo do Dr. Alexandre Câmara, endocrinologista, as principais informações sobre o tratamento de diabetes tipo 2 com o medicamento tirzapatida, sob a marca do Mounjaro.
Em setembro de 2023, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o medicamento tirzepatida. Aproveite a leitura e fique por dentro da novidade.
O que é a tirzepatida?
A tirzepatida é a mais recente inovação no tratamento da obesidade, diabetes tipo 2 e dos problemas metabólicos associados. O medicamento é comercializado pelo laboratório Eli Lilly sob a marca Mounjaro, pertence à classe das twincretinas.
As twincretinas mimetizam as ações dos peptídeos intestinais glucagon-like peptide-1 (GLP-1) e glucose-dependent insulinotropic polypeptide (GIP), ambos fundamentais na regulação da glicemia e nos mecanismos de sinalização da saciedade. Em particular a tirzepatida, que foi desenvolvida para maximizar os benefícios metabólicos desses dois peptídeos.

Mas o que há de diferente no Mounjaro? e por que é considerado uma revolução no tratamento do paciente metabólico?
Para compreender a tirzepatida, é relevante refletir:
Por que, desde 2005, usamos análogos de GLP1 e apenas recentemente surgiram medicações que atuam no GIP?
Inicialmente, pesquisas indicaram que os efeitos da administração de GIP eram reduzidos em pacientes com DM2. Contudo, o cenário mudou quando estudos revelaram que a otimização do controle glicêmico com terapias antidiabéticas poderia reiniciar o efeito insulinotrópico do GIP em pacientes com DM2.
Descobriu-se também que, diferentemente da ação isolada do GIP, a combinação das ações do GLP-1 e GIP poderia resultar em redução de peso.
Assim, o Mounjaro surgiu, revolucionando o tratamento do diabetes tipo 2 e obesidade por diversas razões, entre elas:

1. Modulação da Secreção de Insulina e Glucagon:
A ação bimodal nos receptores de GLP-1 e GIP, peptídeos incretínicos liberados em resposta à ingestão de nutrientes, desempenham funções vitais na homeostase da glicose, intensificando a secreção de insulina e, sob condições de normoglicemia ou hiperglicemia, o GIP também atua suprimindo a secreção de glucagon, otimizando o controle glicêmico ao bloquear a neoglicogênese.
Assim, para o tratamento do DM2, é até mais eficaz que a semaglutida (Ozempic / Wegovy) – conforme ilustrado na figura 3.

No entanto, um outro impacto no metabolismo glicêmico ocorre quando, em condições de jejum e hipoglicemia, o GIP intensifica a secreção de glucagon pelas células alfa do pâncreas.
Teoricamente, essa ação pode reduzir o risco de hipoglicemia, visto que o glucagon atua como um hormônio contrainsulínico.
Além disso, pode propiciar um aumento na produção de corpos cetônicos, fenômeno este que possui um efeito anorexigênico (efeito que também ocorre na dieta cetogênica e no jejum intermitente), favorecendo a perda de peso – assunto que será discutido em breve.
2. Prolongamento da saciedade e redução do peso corporal:
O GLP-1 e o GIP estimulam subconjuntos específicos de neurônios hipotalâmicos, levando à saciedade e consequentemente a diminuição da ingestão de alimentos. Isso resulta em uma perda de peso mais significativa do que aquela obtida apenas com a ativação isolada de um receptor do SNC.
Por isso, o tratamento com tirzepatida, em relação à semaglutida, gera reduções mais expressivas e duradouras na ingestão alimentar, maior oxidação de gordura e aceleração do gasto energético.
Na prática, isso se traduz em uma perda de peso mais acentuada – enquanto a semaglutida 2,4 mg (Wegovy) apresenta uma redução média de peso de 15%, com cerca de um terço dos pacientes atingindo uma diminuição de 20% ou mais, a tirzepatida mostrou uma queda média de 20,9%, sendo que mais da metade dos indivíduos alcançou uma redução de peso maior que 20%.
Notavelmente, quase dois em cada cinco participantes tratados com tirzepatida 15 mg no estudo SURMOUNT-1 obtiveram uma diminuição de peso de 25% ou mais, equivalente aos resultados da cirurgia bariátrica.

3. Lentificação do esvaziamento gástrico:
A tirzepatida também influencia no metabolismo e na ingestão alimentar ao retardar o esvaziamento gástrico, efeito comum dos agonistas do GLP-1. Ao moderar a velocidade com que o alimento transita do estômago para o duodeno, intensifica-se a sensação de saciedade pós-refeição. Isso fortalece o potencial da tirzepatida em restringir a ingestão calórica e promover perda de peso.
4. Modulação do Metabolismo Lipídico:
A tirzepatida apresenta evidências de atuação na regulação do metabolismo lipídico. Além do benefício indireto proveniente da perda de peso, que já otimiza o perfil lipídico, a substância parece ter um efeito direto sobre o gerenciamento de lipídios e lipoproteínas, especialmente ao promover lipólise em acúmulos ectópicos de gordura.
5. Proteção Cardiovascular:
O medicamento pode otimizar diversos marcadores relacionados ao risco cardiovascular, como a diminuição da pressão arterial e dos níveis lipídicos sanguíneos. Pesquisas preliminares também apontam para uma potencial redução na mortalidade cardiovascular.
6. Impacto na Massa Óssea:
A tirzepatida pode melhorar a qualidade e quantidade óssea. Isso se dá pela redução da reabsorção óssea, sem comprometer a formação de novo tecido ósseo.

Quais as principais contraindicações e precauções da tirzepatida?
Como qualquer medicamento, a tirzepatida possui contraindicações e requer precauções.
Os principais efeitos colaterais são gastrointestinais, até metade dos pacientes têm alguma queixa relacionada ao aparelho digestivo durante o tratamento.
Por isso, deve ser usado com cautela em pacientes com antecedentes de problemas gastrointestinais, visto que pode haver desaceleração do esvaziamento gástrico.
Na tabela 01 listamos as principais reações adversas e sua frequência.

Devido aos efeitos colaterais, 8% dos pacientes interrompem o uso da Tirzepatida.
Ao comparar com outros tratamentos, percebe-se que a tirzepatida apresenta mais reações adversas que a semaglutida de 1 mg (Ozempic), a qual 4% dos pacientes interrompem seu uso em decorrência a problemas relacionados ao medicamento. No entanto, seus efeitos colaterais estão no mesmo patamar que a semaglutida de 2,4 mg (Wegovy).
Na prática, supõe-se que pacientes que substituírem o Ozempic de 1 mg pelo Mounjaro de 15 mg possam experimentar mais efeitos adversos. Entretanto, aqueles que transitarem do Wegovy 2,4 mg para a tirzepatida provavelmente não notaram um aumento nos eventos adversos.
Independentemente disso, é fundamental realizar a titulação gradualmente e orientar sobre a administração de medicamentos sintomáticos em caso de sintomas adversos.
Principais contraindicações
As principais contraindicações são o antecedente de pancreatite e hipersensibilidade ao princípio ativo ou a qualquer componente da formulação.
Além disso, não deve ser usada em gestantes ou mulheres que planejam engravidar, pois, apesar de não haver pesquisas nesta população, com base em dados de estudos de reprodução animal, a exposição intraútero à tirzepatida pode causar danos fetais.
É essencial destacar que a tirzepatida pode reduzir a concentração sérica de contraceptivos hormonais devido à diminuição da motilidade gástrica.
Assim, durante as primeiras semanas após o início ou após um aumento da dose da tirzepatida — período de maior reação gastrointestinal —, recomenda-se que pacientes utilizando contraceptivos hormonais orais considerem a alternativa de um método contraceptivo não oral ou adotem adicionalmente um método contraceptivo de barreira.
Esta precaução deve ser mantida por 4 semanas após o início do tratamento e por 4 semanas após cada incremento da dose.
Além disso, a tirzepatida não deve ser combinada com agonistas de GLP1, como semaglutida, liraglutida, dulaglutida, entre outros, nem com inibidores de DPP4.
Tal combinação não traria benefícios adicionais e poderia, potencialmente, intensificar as reações adversas. Fora destas observações, não tem sido relatada outras interações medicamentosas relevantes a serem salientadas.
Como deve ser prescrita e utilizada o Mounjaro?
O Mounjaro é oferecido em formatos de dosagem prontos para administração subcutânea, contidos em um dispositivo de dose única, eliminando a necessidade de preparação prévia à injeção.

É recomendado que a dose inicial seja menor, permitindo a adaptação do corpo à medicação e reduzindo possíveis efeitos colaterais, como náuseas e vômitos. A titulação ocorre conforme a resposta e a tolerância do paciente.
Passos para prescrever o Tirzepatida
A prescrição geralmente segue os seguintes passos:
Aplicação
A aplicação subcutânea é feita no abdômen, coxa ou braço (figuras 6 e 7), alternando os pontos de injeção a cada administração.
A injeção pode ser realizada em qualquer horário, sempre no mesmo dia da semana, independente da ingestão de alimentos.
Dose inicial
A dose inicial é de 2,5 mg uma vez por semana durante 4 semanas, seguida por 5 mg semanalmente. A dose inicial mais baixa (2,5 mg semanalmente) destina-se a reduzir os sintomas gastrointestinais; não fornece controle glicêmico eficaz.
Dosagem
A dosagem pode ser aumentada em intervalos de 2,5 mg a cada 4 semanas, caso necessário, até uma dose máxima de 15 mg por semana.

Mensagens chave
A tirzepatida vem se destacando como uma ferramenta potente no tratamento do DM2 e obesidade.
Embora sua eficácia e segurança a longo prazo ainda estejam sob investigação, a potência do medicamento em melhorar o controle da glicemia e promover perda de peso a coloca como uma terapia promissora para otimizar o gerenciamento da saúde metabólica.
Sugestão de leitura complementar
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Referências
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