Medicina da Família e Comunidade

O que preciso saber para atender casos de micose na infância?

O que preciso saber para atender casos de micose na infância?

Compartilhar
Imagem de perfil de Maitê Dahdal

Confira um artigo completo da Dra. Maitê Dahdal sobre como atender casos de micose!

Garanto que quando você pensa em doenças sazonais em crianças, as doenças respiratórias, de vias aéreas superiores, aparecem em letras garrafais e em luz neon piscante na sua cabeça. Errado não está, mas há também outras doenças que aumentam sua incidência de forma sazonal e não acontecem no inverno. Elas acontecem no período do verão onde tem aquele sol quentinho, ambientes úmidos, muita areia, piscina… locais propícios para o desenvolvimento de fungos que podem causar doenças nas nossas crianças. Vamos falar um pouco sobre isso?

O surgimento de micoses durante o verão como dito acima não é incomum. Vivemos em um país tropical que oferece todas as condições ideais para a proliferação de diversas espécies de fungos patogênicos. Além das condições climáticas ideais temos também o período de férias escolares, que acarreta em maior tempo de interação com água, terra, areia, piscinas, suor, roupas molhadas, sapatos fechados, o que facilita ainda mais a contaminação e pode ocasionar lesões de pele, quebrando a barreira natural de proteção.

Fungos patogênicos: características similares

Os fungos patogênicos, conhecidos cientificamente como dermatófitos, alimentam-se de queratina localizada na pele, pêlos e unhas. Eles podem ser transmitidos diretamente (contato de pessoas com pessoas, animais e terra) e indiretamente através de materiais contaminados.

Há também as dermatomicoses leveduriformes (a famosa pitiríase versicolor, ou pano branco) e a própria cândida pode causar lesões fúngicas também.

Esses fungos não são exclusivos da pele humana, podem acometer também animais e podem estar reservados no solo. A mesma espécie pode causar diferentes sintomas a depender da área afetada e da imunidade prévia da criança. Os locais mais acometidos são: 

  • corpo, 
  • pés, 
  • unhas, 
  • couro cabeludo, 
  • entre os dedos dos pés e
  •  áreas de dobras. 

Para adoecermos existe uma suscetibilidade individual e hereditária, genética. Crianças atópicas são mais propensas a desenvolver dermatofitoses, podendo então muitas vezes ser a criança que vai te procurar tanto no inverno quanto no verão, por motivos distintos.

Principais tipos de micoses

Vamos compreender um pouco mais sobre as principais micoses para que você saiba identificar e tratar no seu dia a dia:

Pitiríase versicolorA mais comum, vulgarmente conhecida como pano branco. Seu agente etiológico, a Malassezia furfur, pode habitar naturalmente nossa pele e quando exposta ao calor e oleosidade provoca surgimento de manchas de múltiplas cores (por isso o nome versicolor), em especial esbranquiçadas, nas regiões de pescoço, rosto e costas. Ela não provoca coceira.
Tinea corporis (micose de tronco, braços e pernas)Gera lesão pruriginosa e inflamatória que se manifesta através de lesão de configuração anular com evolução centrífuga com maior atividade na periferia e tendência à cura central.
Tinea cruris (micose da virilha)Apresenta-se como lesão eritematosa com descamação principalmente em margens. Geralmente poupa o escroto.
Tinea pedisO famoso pé de atleta. Manifesta-se através de maceração, descamação e eritema em região interdigital e lateral dos pés.
OnicomicosePode se manifestar através de manchas brancas na superfície das unhas, hiperqueratose ou onicólise (descolamento da lâmina ungueal do leito ungueal).
Fonte: Autoria própria

Tratamento para micose

O tratamento costuma ser simples e de fácil acesso, tendo medicações disponíveis de forma gratuita nas unidades de saúde dado a importância e relevância do agravo. 

Em raros casos haverá refratariedade às medidas de tratamento convencional, sendo necessário auxílio do médico dermatologista.

É importante ressaltar que quanto mais precoce o tratamento melhor, pois se tratando de uma doença que pode ser transmitida evitaremos a contaminação de outras pessoas.

Medicações para micose e como escolher o melhor tipo 

No tratamento utilizamos medicações antifúngicas que podem ser administradas das mais diversas formas podendo ser via tópica (a mais utilizada) através de pomadas, sprays e até esmaltes e a via oral.

Vamos escolher o tratamento a depender do tipo da infecção, do grau de comprometimento, da topografia das lesões e condições individuais das nossas crianças. Com exceção da tinha do couro cabeludo e algumas situações das unhas, o tratamento tópico deve ser suficiente e deve ser priorizado.

Os antifúngicos utilizados são as aliaminas (terbinafina) e os derivados azoicos como miconazol, clotrimazol, tioconazol. 

O tratamento tópico deve ser aplicado 2 vezes ao dia e costuma ter duração de 7 a 14 dias. 

Tem como prevenir o surgimento de micose?

Importante orientar a criança, a depender da idade, sobre doenças que podem ser transmitidas dessa forma e compartilhar os cuidados preventivos para melhor adesão e aprendizado da criança.

Quais são as medidas?

  • Evitar andar descalço
  • Enxugar muito bem o corpo após chuveiro, piscina e mar → lembrar das áreas de dobras e espaços entre os dedos
  • Não compartilhar toalhas, roupas e outros utensílios pessoais
  • Evitar roupas quentes e de tecido sintético (como poliéster), preferindo roupas de tecidos naturais (algodão, linho)
  • Evitar sapatos abafados, e se usar, utilizar com meias de algodão
  • Cuidar e observar os animais de estimação

Conclusão

A micose é um problema de saúde bastante comum entre crianças (e nos adultos) nessa sazonalidade cujo diagnóstico e tratamento fazem parte das competências dos médicos da atenção primária à saúde. 

Há disponibilidade das medicações nas unidades de saúde, isso facilita ainda mais a adesão ao tratamento. Se houver necessidade de compra, os medicamentos costumam ser medicações de baixo custo. 

A prevenção é extremamente importante uma vez que conhecemos muito bem a história natural da doença e como evitar o seu surgimento. Como no verão há sempre um aumento do índice de procura de consultas médicas por causa desse tipo de lesão de pele, vale a pena a educação em saúde dos nossos pacientes e seus cuidadores. 

Sugestão de leitura

Referências

  • DUNCAN, Bruce et al. Medicina Ambulatorial: condutas de atenção primária à saúde baseadas em evidências. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2022.
  • Infecções dermatofíticas – Sintomas, diagnóstico e tratamento | BMJ Best Practice/ https://bestpractice.bmj.com/topics/pt-br/119. Accessed: 2023-01-08
  • Tinea Corporis. https://www.dynamed.com/condition/tinea-corporis. Accessed: 2023-01-09
  • Tinea corporis: An updated review. Alexander K.C. Leung, Joseph M. Lam et al. Drugs in Context, 9, 7 2020
  • Pediatric dermatophytosis of the skin: current clinico epidemiological and antifungal susceptibility patterns in a tertiary care rural hospital. Pranami Kashyap, YadallaKumar Kishan et al.Indian Journal of Paediatric Dermatology, 22, 3, 2021
  • Treatment of Dermatophytosis in Elderly, Children, and Pregnant Women. Subuhi Kaul, Savita Yadav et al. Indian Dermatology Online Journal, 8, 5, 2017