Índice
- 1 Qual a definição de deficiência de testosterona?
- 2 Quadro 1: sinais e sintomas de hipogonadismo masculino adulto
- 3 Quadro 2: causas de hipogonadismo
- 4 Qual a relação dos níveis de testosterona com a idade?
- 5 Quais as indicações para tratamento de reposição hormonal com testosterona?
- 6 Como deve ser prescrita a terapia de reposição de testosterona para idosos?
- 7 Conclusão
- 8 Sugestão de leitura complementar
- 9 Referências
Dr. Alexandre Câmara reuniu informações sobre as evidências da reposição de testosterona em homens idosos.
Apesar do aumento da expectativa de vida da população nas últimas décadas, os avanços no estudo da saúde sexual dos homens idosos não têm evoluído na mesma velocidade. Isto é evidente quando comparamos os conhecimentos acerca da terapia de reposição hormonal na andropausa e na menopausa, sendo esta última muito mais discutida e aceita pela sociedade médica.
Por isso, nosso objetivo é trazer evidências que auxiliem a promover o envelhecimento saudável e melhorar a qualidade de vida em homens idosos (Bhasin et al., 2018).
Qual a definição de deficiência de testosterona?
O hipogonadismo é uma síndrome clínica que resulta da falha do testículo em produzir concentrações fisiológicas de testosterona e/ou um número normal de espermatozóides.
Diversos sintomas e sinais podem estar relacionados à deficiência de testosterona, por isso os médicos devem ficar atentos.
Algumas queixas são mais específicas, sendo necessário prosseguir a investigação laboratorial, enquanto outros são inespecíficos e precisará ser excluídas outras causas para atribuir a queixa ao hipogonadismo – Quadro 1.
Quadro 1: sinais e sintomas de hipogonadismo masculino adulto

O hipogonadismo também pode resultar de defeitos que afetam tanto o testículo quanto a unidade hipotálamo-hipófise.
Anormalidades no testículo causam hipogonadismo primário, enquanto defeitos do hipotálamo ou da hipófise causam hipogonadismo secundário.
A maioria dos homens idosos com baixos níveis de testosterona tem níveis baixos ou inapropriadamente normais de hormônio luteinizante (LH) e hormônio folículo estimulante (FSH) (hipogonadismo secundário) e uma fração menor tem LH e/ou FSH elevados (hipogonadismo primário).
O hipogonadismo secundário está tipicamente associado à obesidade e comorbidades, enquanto o hipogonadismo primário está mais fortemente associado à idade.
Quadro 2: causas de hipogonadismo

Não existe um limiar bem definido e universalmente aceito de níveis de testosterona abaixo do qual ocorrem sintomas de deficiência androgênica e resultados adversos à saúde.
Por isso, diante da suspeita é fundamental dosar a testosterona pela manhã e caso menor que 320 ng/dL, repetir e prosseguir a investigação.
Figura 1: algoritmo para investigação do hipogonadismo

Qual a relação dos níveis de testosterona com a idade?
A deficiência de testosterona, também chamada de hipogonadismo, é uma condição relativamente comum. 7 a 14% dos homens de meia-idade têm níveis baixos de testosterona total em jejum matinal abaixo de 250 ng/dL.
Mas nos idosos a prevalência do hipogonadismo é ainda maior e aproximadamente:
- 20% em homens com mais de 60 anos,
- 30% naqueles com mais de 70 anos e
- 50% naqueles com mais de 80 anos (Bhasin et al., 2018).
Fatores genéticos, adiposidade e comorbidades afetam a trajetória do declínio relacionado à idade nos níveis de testosterona, que começa em homens com cerca de 30 anos e continua a uma taxa média de 1,6% ao ano (Figura 2).
Esta condição é acompanhada por sintomas clínicos associados à deficiência de andrógenos.
Figura 2: alterações da testosterona com a idade

Este decaimento ao longo da vida é definido por alguns autores como andropausa. Uma síndrome em homens idosos, que consiste em:
Sintomas sexuais
- dificuldade para ereções matinais,
- diminuição da libido e
- disfunção erétil;
Sintomas psicológicos
- fadiga,
- irritabilidade,
- humor deprimido,
- baixa concentração,
- desempenho físico reduzido,
- comprometimento da memória,
- distúrbios do sono, e
- diminuição da função cognitiva.
Alterações metabólicas
- diminuição na densidade mineral óssea,
- obesidade abdominal,
- síndrome metabólica,
- resistência insulínica,
- alterações desfavoráveis no perfil lipídico, envolvendo aumento do LDL e redução no HDL, levando ao diabetes tipo 2 e doença cardiovascular (Araujo & Wittert, 2011; Snyder, 2008).
Apesar de todo este impacto, pode ser um desafio diferenciar quando estas manifestações são consequência da baixa testosterona relacionada à idade ou de outros fatores, como doenças crônicas ou medicamentos concomitantes (Burns-Cox & Gingell, 1997; Sofimajidpour et al., 2015; Tan & Pu, 2004).
Quais as indicações para tratamento de reposição hormonal com testosterona?
O tratamento com testosterona em homens idosos com deficiência sintomática de testosterona oferece benefícios clínicos (por exemplo, melhora dos sintomas sexuais em homens com baixa libido, correção da anemia) e está associado a baixa frequência de eventos adversos.
Mas ainda há controvérsia sobre como deve ser a seleção dos pacientes que teriam impacto clínico significativo no tratamento com testosterona no controle da baixa testosterona.
Alterações clínicas e laboratoriais
Conforme citamos a pouco, em homens mais velhos, as alterações clínicas e laboratoriais potencialmente relacionada ao hipogonadismo, podem ser causadas por:
- doenças crônicas,
- medicamentos e
- outras deficiências hormonais,
- mas também é possível que muitas delas possam ser exacerbadas por uma deficiência relativa de testosterona.
Além disso, as preocupações de segurança em relação ao câncer de próstata e eventos cardiovasculares continuam sendo tópicos importantes no tratamento de homens idosos. Essas doenças são frequentemente subdiagnosticada e subtratada em homens idosos.
Outra dificuldade que torna ainda mais complicada a abordagem em homens mais velhos é que não está claro quais níveis de testosterona “normais” para essa população.
Quais níveis os autores defendem?
Lembrando que para indicar a reposição os níveis são controversos, enquanto alguns autores defendem que a testosterona deveria ser mantida acima de 280–300 ng/dL [9,7–10,4 nmol/L].
O limite inferior do normal para homens jovens saudáveis, outros indicam reposição quando a testosterona abaixo de 200 ng/dL (Corona et al., 2020; Fukai & Akishita, 2009; G. Hackett, 2016; G. I. Hackett, 2016).
Para “ajudar” nesta situação tão nebulosa, o painel de especialistas da Endocrine Society recomenda que “a terapia com testosterona deve ser oferecida de forma individualizada…” (Bhasin et al., 2006, 2018).
Contraindicações da reposição hormonal
Desta forma, é sugerido ponderar oferecer testosterona a homens mais velhos que tenham sintomas e condições sugestivas de deficiência de testosterona. E tenham níveis séricos de testosterona consistente e inequivocamente baixos, salvo contraindicações. São elas:
- História de câncer de mama ou próstata, ou na presença de nódulo na próstata;
- PSA > 3 ng/mL (na ausência de avaliação urológica adicional) e hiperplasia prostática benigna severa não tratada;
- Eritrocitose (hematócrito > 50%) ou hiperviscosidade sanguínea;
- Apneia obstrutiva do sono não tratada;
- Insuficiência cardíaca descompensada;
- Sintomas graves do trato urinário inferior;
- Infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral nos últimos 6 meses;
- Trombofilia.
Sendo fundamental sempre discutir os riscos e benefícios potenciais.

Como deve ser prescrita a terapia de reposição de testosterona para idosos?
Embora a relação causal entre o declínio dos níveis de testosterona e o desenvolvimento de sintomas de andropausa não sempre esteja firmemente estabelecida (por todos os fatores de dificuldade na avaliação já citados), a administração de testosterona a essa população resultou em melhorias em muitas áreas, e inclusive pode levar a um aumento na massa muscular e um declínio na gordura corporal.
Existem vários sistemas de administração de terapia com testosterona. Em geral, preferimos aqueles com farmacocinética mais previsível e com menor pico sérico.
Por isso, as preparações transdérmicas de uso diário e a aplicação trimestral intramuscular de undecilato de testosterona são as opções disponíveis no Brasil mais indicadas.
Tabela 4. Reposição de testosterona

A administração de testosterona não é isenta de problemas (figura 3, portanto o acompanhamento é importante.
Figura 3: efeitos colaterais relacionados a terapia de reposição de testosterona

A cada 6 meses, a eficácia do tratamento e seus efeitos adversos devem ser revistos. Os níveis séricos de testosterona total e livre devem ser verificados em 1 mês. Depois, a cada 6 a 12 meses.
Homens mais velhos com depuração metabólica diminuída de testosterona podem precisar ter suas doses ajustadas de acordo.
O exame de toque retal e as medições do PSA devem ser realizados antes do início da reposição androgênica, aos 3 e 6 meses, e depois anualmente.
Qualquer anormalidade na repetição do toque retal, qualquer elevação do PSA acima da faixa específica para a idade, um aumento significativo na velocidade do PSA acima da faixa específica para a idade (1,4 ng/mL).
Recomendam-se medições periódicas de hematócrito e colesterol total e HDL (a cada 3 meses). Os idosos com osteoporose devem ser monitorados quanto à densidade mineral óssea antes da terapia e 1 ano depois.
Conclusão
Este ainda é um tema nebuloso, mas sua implementação de maneira correta na prática clínica tem grande potencial de auxiliar na promoção da saúde dos pacientes.
Porém, é fundamental discutir os potenciais riscos e possíveis benefícios da terapia com testosterona com pacientes do sexo masculino mais velhos que relatam disfunção sexual. Além disso, é preciso enfatizar aos pacientes que os riscos do tratamento prolongado são desconhecidos.
Também naqueles pacientes em que for indicado a terapia de reposição hormonal. Devemos lembrar de revisitar as decisões de tratamento pelo menos anualmente, e interromper o tratamento na ausência de benefício claro.
Sugestão de leitura complementar
Confira as colunas anteriores:
- ‘Chip da beleza’: como funciona, riscos e benefícios do implante hormonal
- Tratamento do diabetes: impacto da nova geração de insulinas e como utilizá-las na prática clínica
- Diagnóstico de nódulo de tireoide: quando suspeitar de câncer?
Referências
Araujo, A. B., & Wittert, G. A. (2011). Endocrinology of the aging male. Best Practice and Research: Clinical Endocrinology and Metabolism, 25(2), 303–319. https://doi.org/10.1016/j.beem.2010.11.004
Bhasin, S., Brito, J. P., Cunningham, G. R., Hayes, F. J., Hodis, H. N., Matsumoto, A. M., Snyder, P. J., Swerdloff, R. S., Wu, F. C., & Yialamas, M. A. (2018). Testosterone Therapy in Men With Hypogonadism: An Endocrine Society Clinical Practice Guideline. The Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism, 103(5), 1715–1744. https://doi.org/10.1210/JC.2018-00229
Bhasin, S., Cunningham, G. R., Hayes, F. J., Matsumoto, A. M., Snyder, P. J., Swerdloff, R. S., & Montori, V. M. (2006). Testosterone therapy in adult men with androgen deficiency syndromes: An endocrine society clinical practice guideline. Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism, 91(6), 1995–2010. https://doi.org/10.1210/jc.2005-2847.
Prática clínica
Bhasin, S., Cunningham, G. R., Hayes, F. J., Matsumoto, A. M., Snyder, P. J., Swerdloff, R. S., & Montori, V. M. (2010). Testosterone therapy in men with androgen deficiency syndromes: An endocrine society clinical practice guideline. Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism, 95(6), 2536–2559. https://doi.org/10.1210/jc.2009-2354
Burns-Cox, N., & Gingell, C. (1997). The andropause: Fact or fiction? Postgraduate Medical Journal, 73(863), 553–556. https://doi.org/10.1136/pgmj.73.863.553
Corona, G., & Maggi, M. (2022). The role of testosterone in male sexual function. Reviews in Endocrine and Metabolic Disorders. https://doi.org/10.1007/s11154-022-09748-3.
Terapia com testosterona
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Snyder, P. J. (2008). Decreasing testosterone with increasing age: More factors, more questions. Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism, 93(7), 2477–2478. https://doi.org/10.1210/jc.2008-0922
Efeitos
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