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O sarampo é uma doença respiratória aguda, causada por RNA vírus do gênero Morbillivirus da família Paramyxoviridae e apresenta gravidade variável em populações de diferentes níveis socioeconômicos.
Além disso, é uma infecção clássica da infância que pode ser fatal e está na Lista Nacional das Doenças e Agravos de Notificação Compulsória. O Brasil tem empreendido um grande esforço para erradicar essa doença por vacinação, o que resultou em um significativo declínio da prevalência dela.
Epidemiologia
Trata-se de um vírus de ampla distribuição mundial, com sua incidência, evolução clínica e letalidade aparentemente influenciadas pelas condições socioeconômicas, além do estado nutricional e imunitário dos pacientes. No ano 2000, a Organização Mundial da Saúde (OMS), estimou que haviam de 30 – 40 milhões de casos de sarampo no mundo, com 770 mil óbitos. A maior prevalência do sarampo é na infância, poupando lactentes menores de 6 meses pela persistência dos anticorpos maternos.
No Brasil, devido ao aumento da cobertura vacinal a partir da década de 1980 o número de óbitos por essa doença reduziu gradativamente e, em 2000, a circulação endêmica do agente etiológico foi interrompida e casos autóctones deixaram de acontecer. A partir desse ano ocorreram surtos isolados devido a casos importados até que, em setembro de 2016, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) entregou ao Brasil o certificado de eliminação do sarampo.
Mas as coisas mudaram de lá para cá e o Brasil não é mais um país considerado livre do sarampo. Só no ano de 2018 foram 10.262 casos confirmados e no ano de 2019 foram notificados 561 casos, nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Pará. Nesse contexto, vale lembrar que o sarampo é uma doença altamente contagiosa, o que reforça a importância da imunização populacional. Entretanto, a cobertura vacinal no país tem diminuído com o passar dos anos, sendo que esses dados apontam para um dos principais motivos do surto.
Transmissão
A transmissão dessa doença é direta e ocorre por secreções da nasofaringe expelidas por indivíduos contaminados ao falar, tossir, espirrar e respirar. Adicionalmente já foi descrita, em ambientes fechados, a contaminação por aerossóis com partículas virais no ar. O período de transmissibilidade vai de 4 a 6 dias antes do exantema até 4 dias após o aparecimento.
Fisiopatologia do sarampo
A entrada do vírus se dá com a inoculação do vírus no trato respiratório, pelas vias aéreas superiores onde ele infecta linfócitos, macrófagos alveolares e células dendríticas. Em seguida, o vírus sofre replicações sucessivas no epitélio da mucosa e se dissemina através da via linfática, atingindo, posteriormente, a via sanguínea. Com isso, é possível que o vírus cause uma viremia, engendrando uma elevada disseminação sistêmica do antígeno pelo corpo devido à forma de infecção do vírus ocorrer por meio das células epiteliais e endoteliais dos órgãos (transmissão direta entre as células).
O vírus pode se instalar em tecidos como a conjuntiva, trato urinário, capilares sanguíneos, tecido linfático, sistema nervoso central e no trato respiratório, onde o vírus leva a necrose epitelial e a formação de células gigantes. O vírus causa certa repressão da resposta Th1 gerando imunossupressão.
A infecção das células endoteliais e dos linfócitos T gera a alteração macroscópica denominada exantema, a qual é um sinal característico dessa infecção viral. Outros efeitos sistêmicos mais raros dessa viremia são uma encefalite pós-infecciosa de etiologia imunológica e uma panencefalite esclerosante subaguda ocasionada por vírus mutantes no sistema nervoso central. Caso a infecção seja tratada o indivíduo adquire uma imunidade vitalícia devido à memória imunológica do organismo, caso esse quadro não seja revertido o indivíduo pode evoluir a óbito devido a uma falha na imunidade mediada por células.
Quadro clínico de sarampo
O sarampo possui um período de incubação que varia de 7 – 18 dias, quando se iniciam febre e mal-estar do pródromo da infecção. Segundo o Guia de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde de 2019, o quadro clínico do sarampo é dividido em três fases bem definidas:
- período prodrômico ou catarral;
- período de estado ou exantemático;
- período de convalescença ou de descamação furfurácea.
Período prodrômico
Tem uma duração média de 6 dias, no início da doença. Todas as mucosas são comprometidas, resultando em um cortejo de sintomas muito característicos (febre, tosse produtiva, coriza, lesões de mucosa e boca e linfadenomegalia) pela manifestação clinica desse comprometimento. Nas últimas 24 horas desse período, surge, na altura dos pré-molares, o sinal de Koplik, pequenas manchas brancas com halo hiperemiado, consideradas como sinal patognomônico.
Período exantemático
Nesse momento, o paciente apresenta piora de todos os sintomas descritos, com prostração importante, quando, então, o exantema que caracteriza o sarampo aparece em surtos sucessivos. Surgem manchas sobrelevadas, maculopapulares, de cor avermelhada, com pele normal entre elas, distribuindo- se em sentido cefalocaudal.
Período de convalescênça
Nesse período as manchas tornam-se escurecidas e surge descamação fina, lembrando farinha, característica descrita no nome da fase – descamação furfurácea.
Diagnóstico
O diagnóstico de sarampo é clínico-epidemiológico. Em casos de dúvida diagnóstica é possível a realização do teste sorológico. A sorologia utiliza a técnica de ensaio imunoenzimático (ELISA) e detecta anticorpos IgM específicos e soro conversão ou aumento de anticorpos IgG. Os IgM são detectados na fase aguda da doença (dos primeiros dias até 4 semanas após aparecimento do exantema) e os IgG ainda são detectados muitos anos após a infecção.
Os casos em que os resultados forem de IgM reagente ou inconclusivo devem ser notificados imediatamente e a coleta de segunda amostra de sangue deverá ser realizada entre 15 e 25 após a primeira coleta.
Além disso, segundo o protocolo do Ministério da Saúde, a pesquisa para identificação do vírus pode ser realizada em amostras de orofaringe, nasofaringe e urina (coletadas até o 7º dia após aparecimento do exantema, principalmente nos 3 primeiros dias) a partir da técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR). Isso é importante para conhecer o genótipo do vírus, diferenciar vírus selvagem de vírus vacinal e diferenciar casos autóctones de casos importados.
Diagnóstico diferencial
Dentro do universo pediátrico, as principais doenças que fazem diagnóstico diferencial com o sarampo são: eritema infeccioso, doença de Kawasaki, exantema súbito e escarlatina, enquanto que nos adultos são: dengue, rubéola, infecção aguda pelo HIV.
Tratamento do sarampo
Não existe tratamento específico para o sarampo, sendo que, por ser uma doença autolimitada, os recursos terapêuticos visam aliviar os sintomas. Dessa maneira, é de grande importância atentar para a promoção de uma maior ingesta de líquidos e de um amparo nutricional, como também atentar para a administração de antipiréticos.
A desnutrição e a desidratação devem ser combatidas com cuidados especiais, hidratação com soro fisiológico a ½, ou a ¼ quando em lactente, sempre com soro glicosado de 5 – 8%, com realimentação precoce, em 12 horas. A vitamina A está recomendada, principalmente, para os pacientes desnutridos.
Segundo o Guia de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde de 2019, é recomendado ministrar vitamina A, na forma de palmitato de retinol, para todas as crianças diagnosticadas com sarampo, visando diminuir o número de casos graves e fatais, assim como prevenir as complicações da doença. As seguintes dosagens são preconizadas:
- 50.000UI de palmitato de retinol na forma de solução oral para crianças com idade entre 0 e 6 meses;
- 100.000UI de palmitato de retinol na forma de cápsula para crianças com faixa etária entre 6 meses e 11 meses e 29 dias;
- 200.000UI de palmitato de retinol na forma de cápsula para crianças acima de 12 meses de idade.
Independente do grupo etário, deve-se administrar 2 doses, sendo a primeira no dia do diagnóstico e a segundo no dia seguinte.
Ficha clínica do sarampo:

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Referências
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA. Tratado de pediatria – Dennis Alexander Rabelo Burns… [et al.]]. 4ª edição. Monole, 2017.
NELSON. Tratado de Pediatria – Richard E. Behrman, Hal B. Jenson, Robert Kliegman. 18ª Edição. Elsevier. 2009.