Carreira em Medicina

Semiologia Respiratória: principais motivos de consulta e exame físico

Semiologia Respiratória: principais motivos de consulta e exame físico

Compartilhar
Imagem de perfil de Comunidade Sanar

A principal função do sistema respiratório, como todos já sabemos, é a troca entre oxigênio e gás carbônico através da inspiração e da expiração, sendo o responsável dessa grande façanha o nosso trato respiratório.

O trato respiratório é dividido em três seções, para melhor entendimento:

  • Trato respiratório superior: constituído pelo nariz e fossas nasais, seios paranasais e faringe.
  • Trato respiratório médio: composto por laringe, traqueia, brônquios e bronquíolos.
  • Trato respiratório inferior: são os pulmões propriamente ditos, que são constituídos pelos bronquíolos respiratórios, ductos alveolares, sacos alveolares e alvéolos.

Os pacientes que procuram o consultório por afecções respiratórias podem consultar tanto por sintomas dependentes do sistema respiratório como tosse ou dispneia, entre outros; como por sinais ou sintomas gerais como febre, por exemplo.

Esses sinais e sintomas constituem indícios ou suspeita de uma patologia respiratória. Um interrogatório bem realizado junto à execução de um exame físico minucioso permitirá observar características precisas de cada um dos motivos de consulta, e orientarão o plano de estudo que confirmará o diagnóstico.

Os principais motivos de consulta dependentes do sistema respiratório são os seguintes:

  • Tosse
  • Expectoração
  • Dispneia
  • Hemoptise
  • Dor torácica
  • Cianose

Os principais sinais e sintomas gerais que levam o paciente à consulta:

  • Febre
  • Astenia
  • Anorexia
  • Perda de peso

Principais motivos de consulta

  1. TOSSE

A tosse é um dos motivos de consulta mais comum tanto em homens como em mulheres, de todas as idades. Além disso, é muito frequente em quase todas as doenças respiratórias.

É um mecanismo de defesa que funciona sobre um reflexo da tosse. Uma sucessão de movimentos expiratórios violentos efetuados contra uma glote entrecerrada, por meio dos quais o ar contido nas vias aéreas e nos pulmões, além das secreções e eventuais corpos estranhos, são expelidos ao exterior.

A tosse muitas vezes atua como um mecanismo de defesa do sistema respiratório e por isso não deve ser inibida com antitussígenos, ao contrário, é indicado facilitá-la com o uso de mucolíticos e expectorantes.

A tosse pode se classificar segundo a sua duração, suas características e ainda há distinção se é acompanhada ou não de hipersecreção bronquial.

Segundo a sua duração, a tosse pode ser:

  • Aguda: duração menor a três semanas
  • Subaguda: dura entre três e oito semanas
  • Crônica: duração maior a oito semanas

No geral, o mais importante entre as características da tosse, é saber se a tosse aparece acompanhada ou não de hipersecreção bronquial, isto é, se a tosse é úmida ou seca. Além disso, se há secreção e esta é eliminada em forma de expectoração, a tosse se denomina produtiva.

Geralmente uma tosse seca aparece em processos irritativos que podem estar localizados desde a laringe até a pleura. Já a tosse produtiva costuma indicar a presença de um processo infeccioso ou inflamatório da árvore brônquica ou do parênquima pulmonar. Na maioria dos casos, a tosse produtiva é precedida ou dá lugar a um período variável de tosse seca irritativa.

Quando se trata de uma tosse produtiva é indicado averiguar as características e quantidade de secreção.

Segundo a intensidade do estímulo irritativo, a quantidade de secreção e a susceptibilidade individual, a tosse pode ser leve ou intensa.

  • EXPECTORAÇÃO

Normalmente, em pessoas sem nenhuma doença respiratória, as glândulas do trato respiratório e as células caliciformes do epitélio bronquial produzem 100mL diários de secreção seromucosa, que são deglutidos diariamente de forma imperceptível por um adulto normal. Por isso, qualquer eliminação de secreção procedente do aparelho respiratório é anormal, e esse sintoma se denomina expectoração, que segundo seu aspecto macroscópico pode ser classificada em:

  • Serosa
  • Mucosa
  • Mucopurulenta e Purulenta
  • Sanguinolenta
  • HEMOPTISE

Se denomina hemoptise a eliminação pela boca de sangue procedente das vias respiratórias inferiores.

É um sintoma de alto impacto, por ocasionar grande temor nos pacientes, costuma ser um motivo de consulta que leva o paciente a procurar um médico rapidamente.

Pode apresentar alterações variáveis quanto a gravidade e extensão. Muitas vezes não é possível estabelecer sua etiologia, apesar da realização de muitos exames.

Deve ser realizado diagnóstico diferencial, já que sangue procedente de outras origens também pode ser eliminado pela boca:

  • Na hematemese, náuseas e vómitos precedem a emissão de sangue, que pode ser escuro e ter coágulos ou restos alimentares.
  • A epistaxe produz sangue vermelho, sem tosse e facilmente visível através das narinas ou por via nasal posterior.
  • Na gengivorragia se observa que o sangue emana da gengiva previamente inflamada, edematosa.
  • DISPNEIA

A dispneia é uma sensação desagradável de dificuldade ou incapacidade física para manter uma função respiratória correta, à qual muitos pacientes se referem como falta de ar.

A sensação de dispneia tem origem na estimulação de receptores periféricos e centrais que controlam a atividade dos músculos respiratórios, a hipóxia, hipercapnia, equilíbrio ácido base e as mudanças na relação pressão/volume do pulmão. Por isso, a dispneia pode estar ocasionada por problemas cardiopulmonares, hematológicos, do meio ambiente (altitude), obesidade, febre, exercício ou até por causas puramente psíquicas.

Em determinadas circunstâncias, a sensação subjetiva de dispneia vem acompanhada de evidências objetivas da incapacidade ventilatória que se manifesta por alterações da frequência e do ritmo respiratório: são exemplos típicos a batipneia e a taquipneia.

A dispneia pode se classificar de acordo ao Medical Research Council (MRC), que a correlaciona com a atividade física:

  • Grau 0: dispneia em esforços extremos, como correr e subir escadas íngremes
  • Grau 1: dispneia ao andar depressa ou em subidas leves
  • Grau 2: dispneia ao caminhar normalmente
  • Grau 3: dispneia ao caminhar menos de 100 metros
  • Grau 4: dispneia em atividades habituais como tomar banho ou trocar de roupa
  • DOR TORÁCICA

A dor torácica pode se dever a inúmeras causas. Através da anamnese e do exame físico, o eletrocardiograma e a radiografia de tórax procuramos descartar com a maior precisão possíveis causas que possam colocar em risco a vida do paciente.

Por fins didáticos, a dor torácica se divide segundo a sua fisiopatologia:

  • Dor visceral
  • Dor referida
  • Dor de origem mediastinica
  • Dor somática

Exame físico

Para realizar um exame físico do sistema respiratório é necessário ter pleno conhecimento da topografia torácica, e da projeção dos lóbulos pulmonares na superfície do tórax.

O exame físico deve ser feito de forma sistemática e ordenada, na seguinte ordem:

  • Inspeção
  • Palpação
  • Percussão
  • Ausculta
  1. INSPEÇÃO

A inspeção pode ser dividida em duas partes: estática e dinâmica.

A) ESTÁTICA

Deve-se avaliar o tórax de maneira estática, a sua aparência, para detectar a presença de deformações que podem ser de origem congénita ou adquirida.

No exame estático, observamos o formato do tórax e a estrutura do esterno, costelas e vértebras, pois pode ser indicativo de alterações estruturais como o pectus excavatum, pectus carinatum, entre outros.

B) DINÂMICA

A inspeção dinâmica nos permite avaliar no paciente:

  • Tipo respiratório (em condições normais é costal superior na mulher, costoabdominal no homem e abdominal na criança)
  • Frequência respiratória (normalmente de 12 a 20 incursões por minuto)
  • Amplitude respiratória (seu aumento denomina-se batipneia, ou respiração profunda e sua diminuição hipopneia ou respiração superficial)
  • Ritmo respiratório (a regularidade dos ciclos entre inspiração, expiração e apneia, que normalmente é 3:2:1)

Os padrões respiratórios mais comuns que podem ser avaliados no exame físico dinâmico são:

  • Eupneia: respiração normal, sem dificuldades, com frequência, amplitude e ritmo normais.
  • Taquipneia: respiração com frequência aumentada
  • Bradipneia: respiração com frequência diminuída
  • Hiperpneia: respiração profunda
  • Hipopneia: respiração superficial
  • Dispneia: falta de ar
  • Apneia: parada respiratória
  • Respiração de Cheyne-Stokes: série de respirações de profundidade crescente, depois decrescente, seguido de um período de apneia que pode variar de 10 a 30 segundos
  • Respiração de Biot: tipo de respiração periódica na qual se alternam períodos de apneia de variável duração com ciclos de respirações de profundidade variável
  • Respiração de Kussmaul: inspiração ampla e profunda, seguida de uma breve pausa e posterior expiração curta, para dar lugar a uma pausa mais prolongada

No momento da inspeção dinâmica, também levamos em conta a expansibilidade torácica do paciente, para determinar se ele tem uma diminuição da expansibilidade ou se possui dificuldade respiratória, o que se caracteriza pelo uso da musculatura acessória, tiragem intercostal, retração do diafragma e batimento da asa do nariz.

  1. PALPAÇÃO

A palpação do tórax permite verificar e complementar os achados da inspeção, além de ter como objetivo identificar a presença de áreas dolorosas e avaliação de anormalidades, também permite uma avaliação secundaria da expansibilidade do paciente.

A técnica adequada é com as palmas da mão do médico passando por todas as regiões do tórax, seguido de uma palpação mais profunda e metódica, dando ênfase aos detalhes que tenham chamado a atenção, onde podemos avaliar:

  • Alterações da sensibilidade
  • Frêmito ou roce pleural
  • Frêmito brônquico ou roncus palpável
  • Presença de adenopatias

A expansibilidade torácica é avaliada através dos polegares do examinador, que deve margear as costelas, pedindo para o paciente realizar movimentos inspiratórios e expiratórios profundos. Com esta técnica podemos comprovar se ambos os lados têm expansibilidade simétrica.

A avaliação do frémito tóraco-vocal também é realizada nesse momento o exame físico. Se explora com as palmas das mãos recorrendo ambos hemitórax de cima abaixo enquanto pedimos para o paciente pronunciar as palavras “trinta e três”. A exploração do frémito tóraco-vocal é importante, pois auxilia no diagnóstico de processos patológicos, tais como derrame pleural ou consolidações pulmonares.

  • PERCUSSÃO

A percussão deve ser realizada com a técnica dígito-digital de Gerhardt, na qual o dedo percutor (indicador ou médio da mão dominante) deve percutir o dedo plexímetro (indicador ou médio da outra mão) que deve estar apoiado horizontalmente em um espaço intercostal.

O examinador deve prosseguir a percussão realizando sempre a comparação entre os sons produzidos na porção de um hemitórax com o outro contralateral.

É possível identificar quatro sons pulmonares:

  • Som claro pulmonar: som da percussão pulmonar normal, entre a maciez e o timpanismo.
  • Som timpânico: som característico de estruturas “ocas” com grande quantidade de ar no parênquima pulmonar ou na cavidade torácica. É encontrado em casos de enfisema pulmonar e pneumotórax.
  • Som submaciço: ocorre quando há líquido interposto entre o parênquima pulmonar e a parede torácica, como em derrames pleurais.
  • Som maciço: obtido quando se percute regiões mais “densas”, ou seja, quando há uma diminuição da quantidade de ar no pulmão, ou em suas proximidades. Geralmente é característica de tumores periféricos e em pneumonias.

A percussão pode apresentar certas alterações que não determinam estados patológicos.

  • AUSCULTA

A ausculta aporta dados importantes sobre o estado do parênquima pulmonar e das pleuras. Realiza-se com o estetoscópio biauricular enquanto pedimos para que o paciente respire de forma lenta e profunda com a boca entreaberta, sem realizar barulho. Assim como na percussão, deve-se realizar uma comparação entre as duas regiões simétricas do hemitórax, desde o ápice até a base, em pelo menos 4 pontos.

Os achados normais na ausculta, podem ser classificados como:

  • Som traqueal: produzido pelas turbulências geradas com a passagem do ar através da via aérea alta.
  • Respiração brônquica: representa a sobreposição, em determinadas regiões do pulmão, do som traqueal e dos murmúrios vesiculares.
  • Murmúrios vesiculares: perceptível em todas as regiões em que o pulmão normalmente está em contato com a parede torácica. São os sons normais da respiração, representa o som causado pela entrada e saída de ar dos pulmões. Pode estar ausente ou diminuído se houver algo que obstrua seu caminho ou impeça que o ar entre e saia do pulmão.

Em situações patológicas é possível auscultar ruídos adventícios (sons anormais), indicativos de certas alterações. Os principais são:

  • Estertores finos (crepitações)
  • Estertores grossos
  • Roncos
  • Atrito Pleural
  • Estridor

A semiologia respiratória é muito importante, já que muitas vezes conseguimos chegar ao diagnóstico somente realizando anamnese e um exame físico adequado e, quando não conseguimos fechar o diagnóstico, os achados no exame físico nos direcionam aos exames complementários ideais para fechar nossa suspeita diagnóstica. Em suma, é dever de todo bom profissional da saúde realizar um correto, ético, completo e minucioso exame físico, explorando em detalhes cada sinal encontrado no paciente.

Autora: Gabriela Leoncio de Sá

Instagram: gabifdesa

Referências Bibliográficas

https://www.scielo.br/j/jbpneu/a/X6G48YN9xtddvFdDmBc94hh/?lang=pt&format=pdf

ARGENTE – ALVAREZ, Semiología Médica, 2ª Ed

http://semiologiahnc.webs.fcm.unc.edu.ar/files/2018/05/2018_AP6_APARATO_RESPIRATORIO.pdf

http://semiologiahnc.webs.fcm.unc.edu.ar/files/2019/06/2019-TEORICO_APARATO_RESPIRATORIO_NORMAL.pdf

Leituras Relacionadas



O texto é de total responsabilidade do autor e não representa a visão da sanar sobre o assunto.

Observação: material produzido durante vigência do Programa de colunistas Sanar junto com estudantes de medicina e ligas acadêmicas de todo Brasil. A iniciativa foi descontinuada em junho de 2022, mas a Sanar decidiu preservar todo o histórico e trabalho realizado por reconhecer o esforço empenhado pelos participantes e o valor do conteúdo produzido. Eventualmente, esses materiais podem passar por atualização.

Novidade: temos colunas sendo produzidas por Experts da Sanar, médicos conceituados em suas áreas de atuação e coordenadores da Sanar Pós.