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As Complicações Cirúrgicas ainda são um desafio no tratamento operatório dos pacientes. Elas constituem uma possibilidade real no dia a dia do cirurgião.
Frequentemente, os resultados funcionais das operações são comprometidos pelas complicações, podendo, em alguns casos, fazer com que o paciente nunca recupere o nível funcional pré-operatório.
Observa-se que a parte mais significante e difícil das complicações é o sofrimento impingido ao paciente que, ao entrar no hospital, espera que será curado de uma determinada patologia, sem que existam intercorrências, mas acaba exposto a sofrimentos e dificuldades por causa das complicações cirúrgicas.
Causas das Complicações Cirúrgicas
Sabe-se que existem diversos motivos relacionados com as causas das complicações, mesmo que o cirurgião adote uma técnica cirúrgica adequada, a cirurgia não está livre das intercorrências.
No entanto, é verdade que um cirurgião descuidado pode cometer erros técnicos que contribuem para o surgimento das complicações.
Nesse sentido, percebe-se que o risco de eventos adversos diminui muito com um cuidadoso processo de avaliação pré-operatória, como: estado nutricional do paciente, condição pulmonar e cardíaca do doente e outras questões relacionadas a possíveis comorbidades e medicações em uso.
Ademais, uma realização cuidadosa dos tempos cirúrgicos (diérese, hemostasia, exérese e síntese) diminui a possibilidade de complicações cirúrgicas, da mesma forma que o uso criterioso de medicações pré-operatórias, como os antibióticos, podem exercer influência no pós-cirúrgico, evitando o surgimento de situações complicadas.
Vigilância pós-operatória
Após o término da operação, a vigilância é obrigatória. A avaliação completa, cuidadosa e regular dos pacientes nesse período permite ao cirurgião detectar precocemente as complicações, de modo a permitir o tratamento delas de forma mais rápida e efetiva.
Na vigilância pós-operatória, alguns elementos merecem atenção especial, como feridas operatórias, avaliar a ingestão e o débito do paciente (em especial, o urinário), checar os perfis de temperatura (curva de temperatura), verificar os níveis de atividade, avaliar o estado nutricional e checar os níveis de dor.
Com isso, o cirurgião prudente irá lidar de maneira mais rápida, completa e apropriada com as possíveis complicações cirúrgicas.
Complicações Cirúrgicas da Ferida Operatória
Seroma
O seroma é uma coleção de gordura liquefeita, soro e líquido linfático, que se forma sob a incisão cirúrgica. Esse líquido, geralmente, é claro, amarelado e um pouco viscoso, sendo encontrado na camada subcutânea, logo abaixo da derme.
São representantes das complicações mais benignas após um procedimento cirúrgico, ocorrendo quando se cria um grande retalho de pele no curso da operação, como visto nos casos de mastectomias, dissecções auxiliares, dissecção da região inguinal e em grandes hérnias ventrais.
No geral, se apresentam como um edema localizado e bem circunscrito, com desconforto à pressão e ocasional drenagem de líquido claro pela ferida imatura.
A prevenção pode ser obtida pela colocação de drenos de sucção sob os retalhos de pele ou no potencial espaço morto criado pela linfadenectomia, de modo que a retirada prematura desses drenos resulta, no geral, em grandes seromas, que requerem aspirações repetidas, sob condições estéreis, seguidas pela colocação de curativos compressivos.
Quando um seroma reacumula após pelo menos duas aspirações, deve ser evacuado pela abertura da incisão e limpeza da ferida com gaze umedecida com solução salina para permitir cicatrização por segunda intenção. Ademais, um seroma infectado também é tratado por drenagem aberta.
Imagem: Aspiração de seroma. Fonte: Sitapati.info/Reprodução
Hematoma
Trata-se de uma coleção anormal de sangue, geralmente na camada subcutânea de uma incisão recente ou em um espaço potencial na cavidade abdominal após exérese de um órgão, como o hematoma na loja esplênica após uma esplenectomia.
É uma complicação mais preocupante do que os seromas, pois possui um maior potencial para infecções secundárias. A formação do hematoma se dá com sangramento na camada envolvida após o fechamento da pele, estando relacionado com a hemostasia, depleção dos fatores da coagulação e presença de coagulopatia.
As manifestações clínicas variam de acordo com o tamanho e localização do hematoma, podendo se manifestar como uma tumefação expansiva ou como dor na área da incisão cirúrgica, ou como ambas. Quanto aos locais de surgimento, tem-se diferentes manifestações, como: no pescoço – comprometimento de via aérea; no retroperitônio – íleo paralítico, anemia e outras; extremidades e cavidade abdominal – síndrome compartimental.
Para prevenção do hematoma, deve-se corrigir no pré-operatório qualquer anormalidade da coagulação e descontinuar medicamentos que a alterem. Quando o hematoma é pequeno, não exige nenhuma intervenção e acabará sendo reabsorvido, mas hematomas maiores ou que possam comprometer funções vitais (como obstrução de vias aéreas) podem ser drenados.
SE LIGA! Várias condições podem favorecer o surgimento dos hematomas por se relacionarem com a coagulopatia, tais como distúrbios mieloproliferativos, insuficiência hepática e renal, septicemia, deficiência dos fatores de coagulação e também o uso de medicamentos (aspirina, clopidrogel, heparina e outros).
Deiscência da ferida operatória
É a separação das camadas musculoaponeuróticas no início do curso pós-operatório. Está entre as complicações mais temidas, pois há possibilidade de evisceração e necessidade de intervenção imediata, além de haver possibilidade de deiscência repetida, infecção da ferida e formação de hérnia incisional.
Essa complicação ocorre em cerca de 1 – 3% dos pacientes submetidos a operações abdominais, ocorrendo com maior frequência com 7 – 10 dias de pós-operatório, mas pode ocorrer a qualquer momento, entre 1 a mais de 20 dias.
No geral, está relacionada com erros técnicos de suturas muito próximas a margem, muito distante, ou sob grande tensão, e a infecção profunda é uma das causas mais comuns de separação localizada da ferida, além de outros fatores que podem contribuir, como pressão intra-abdominal aumentada e fatores que influenciam adversamente a cicatrização da ferida.
A deiscência pode ocorrer sem aviso e a evisceração torna o diagnóstico óbvio e, nos casos iniciais, a investigação pode ser feita com um aplicador de ponta de algodão estéril ou com o dedo enluvado na ferida, para detecção da deiscência. Para prevenção, pode-se lançar mão de sutura com pontos separados.
Uma vez diagnosticada, o tratamento depende da extensão da separação da fáscia e da presença de evisceração ou contaminação intra-abdominal significativa. Dessa forma, uma deiscência pequena pode ser tratada conservadoramente, cobrindo a ferida com gaze umedecida e uma bandagem abdominal e, no caso de evisceração, os intestinos devem ser cobertos com uma compressa estéril umedecida com solução salina e o paciente deve ser preparado para retornar para sala de operação após um período curto de reanimação volêmica.
Durante a reabordagem cirúrgica, realiza-se uma exploração completa da cavidade abdominal para exclusão de foco séptico ou uma deiscência anastomótica que possa ter predisposto a deiscência da incisão cirúrgica. O tratamento da infecção tem importância crítica antes de se tentar o fechamento da parede abdominal.
Se a fáscia estiver infectada ou necrótica, realiza-se seu desbridamento, se após isso as margens da fáscia não puderem ser aproximadas sem tensão indevida, deve-se considerar o fechamento com tela absorvível ou com as próteses biológicas.