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Pseudocistos pancreáticos (PP’s): quando suspeitar e como diagnosticar?

Pseudocistos pancreáticos (PP’s): quando suspeitar e como diagnosticar?

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Entenda o que são os pseudocistos pancreáticos, o que pode levar ao médico a suspeitar desse quadro e como diagnosticá-lo no seu paciente. Bons estudos!

Os pseudocistos pancreáticos podem ser causados por muitos diferentes fatores, podendo surgir durante qualquer faixa etária. Esse quadro pode se tornar grave e, por esse motivo, é fundamental saber reconhecer essa condição.

O que são os pseudocistos pancreáticos?

Os pseudocistos pancreáticos são falsos cistos no pâncreas, de conteúdo líquido, podendo ser o próprio líquido pancreático.

A formação dos pseudocistos tem uma íntima relação aos eventos de pancreatite aguda e crônica. Pensando nisso, eles podem ser classificados pelos seguintes tipos, segundo D’Egidio e Schein (1991):

  • I: agudo pós-necrótico;
  • II: pós-necrótico em pacientes com pancreatite crônica;
  • III: de retenção.

Os PP’s pós necróticos, tipo I, agudos costumam ocorrer após episódios de pancreatite aguda. Eles se relacionam à anatomia do ducto pancreático, raramente se comunicando à ele.

Já o tipo II, relacionados à pancreatite crônica, evidencia uma doença no ducto pancreático, embora ele ainda não esteja estenosado, podendo haver comunicação entre essas duas estruturas. Por fim, os de retenção, tipo III, está uniformemente associado à estenose do ducto e comunicação do pseudocisto.

A conexão dos cistos com o ducto pancreático podem não ser identificadas pela própria inflamação local, levando a uma selagem dessa comunicação.

Etiologia e epidemiologia dos pseudocistos pancreáticos: o que conseguimos mensurar?

Como comentamos, os pseudocistos pancreáticos ocorrem paralelamente à pancreatite e, por esse motivo, essa etiologia se aproxima às causas dessa doença.

Sabe-se ainda que a formação dessas estruturas está ainda mais relacionada à ocorrência de pancreatites crônicas quando comparada às agudas. Somado à isso, de maneira geral, são as pancreatites alcoólicas que mais se responsabilizam por essas formações, em especial nos países de alto consumo alcoolico.

Levando esse fato em consideração, levantamentos realizados pela Organização Mundial da Saúde em 2020 revelaram que os países que mais consomem álcool no mundo são:

  1. Bielorússia;
  2. Moldávia;
  3. Lituânia.

Outros estudos ainda apontaram a formação de pseudocistos pancreáticos por doenças em trato biliar, traumas fechados e penetrantes ou mesmo causas idiopáticas.

Em resumo, a incidência dos pseudocistos pancreáticos é baixa, chegando a apenas 4,5% ao ano, a cada 100.000 adultos. Essa incidência sobe bastante quando feito um recorte entre os casos de pancreatite crônica, chegando a 40%.

Patogênese: como os pseudocistos pancreáticos são formados?

O fato que leva à grande associação entre a pancreatite e a formação dessas estruturas císticas é explicada pela sua patogênese.

Isso porque essa formação parece resultar exatamente das rupturas do ducto pancreático, tão comuns nos episódios da pancreatite. Isso também pode acontecer em outras condições, como no trauma, o que justifica a sua associação também com traumas fechados e penetrantes.

Embora ainda não seja tão bem compreendido o processo de formação dos PP’s, entende-se que dois processos estão relacionados:

  1. Exacerbação da doença subjacente e/ou;
  2. Um bloqueio do ramo principal do ducto pancreático, por meio de um tampão proteico, ou ainda um cálculo ou fibrose na região.

Pelo que os pseudocistos pancreáticos se caracterizam?

De maneira geral, o conteúdo líquido no interior dos PP é rico em amilase e outras enzimas pancreáticas.

Outros componentes do fluido interno nos pseudocistos são sangue hemolizado e resíduos necróticos de tecidos adjacentes ao pâncreas.

O que torna os pseudocistos de fato “falsos” em comparação aos verdadeiros cistos pancreáticos o tecido que o envolve. Assim, os PP’s, são envolvidos por tecido fibroso, enquanto que os cistos verdadeiros, por tecido epitelial.

Quais as manifestações dos pseudocistos pancreáticos no paciente?

As manifestações clínicas dos pseudocistos pancreáticos podem variar imensamente. Isso é observado na prática, em que se pode observar um paciente assintomático ou, ainda, uma grande catástrofe abdominal.

Com isso em mente, as complicações agudas e crônicas podem incluir sangramento e obstrução de saída gástrica. Sobre o sangramento, uma grande possibilidade é um pseudoaneurisma de artéria esplênica.

Outros possíveis achados que sugerem complicações são infecção e ruptura dos pseudocistos.

Diagnósticos dos PP’s: como realizar

Pensando em diagnosticar os pseudocistos pancreáticos, é importante que o médico tenha em mente diferenciar esse diagnóstico de outras condições abdominais ou ainda lesões císticas pancreáticas.

Diagnóstico diferencial das lesões císticas no pâncreas. Em que: SCA: Cistadenoma seroso; NCM: Neoplasia cística mucinosa; IPMN: Neoplasia mucinosa papilar intraductal; NPS: Neoplasia sólida pseudopapilar. Fonte: Habashi et al, 2009.

Através da Ultrassonografia Transabdomianl (USG), os PP’s são vistos como estruturas ecoicas, bem definidos e de formato ovalado. É possível que, a depender do tempo de formação, o conteúdo interno apresente-se com vários graus de ecos internos. Isso pode se justificar pelo conteúdo necrótico, que costumam ser limpos ao longo do tempo.

Embora seja um exame importante para a investigação do conteúdo cístico, a TC abdominal apresenta-se superior à US em termos de sensibilidade diagnóstica. Considerando isso, a TC pode ser o único exame a ser feito, capaz de diagnosticar sozinho a presença do pseucocisto de pâncreas.

Esse exame é especialmente interessante na medida em que oferece informações para além do próprio PP. Assim, é possível entender a anatomia vizinha à essa estrutura, bem como calcificações do ducto pancreático e dilatação no ducto biliar .

Pseudocistos pancreáticos
Tomografia computadorizada mostrando um pseudocisto pancreático maciço comprimindo o estômago e obliterando o pâncreas. Fonte: Shah et al., 2022.

É importante saber que, para considerar a formação cística como um pseudocisto pancreático, ele deve atender a alguns critérios. Tendo ocorrido após um episódio de pancreatite aguda, apenas se a formação líquida ocorrer nas 4 a 6 semanas seguintes ao episódio e margeada por tecido fibroso será considerado PP.

Conduta atual nos pseudocistos pancreáticos: como proceder?

Atualmente, os pseudocistos pancreáticos são conduzidos de maneira conservadora, por meio de uma cirurgia.

Ela é indicada na impossibilidade de drenagem transparietal ou endoscópica, ou ainda na falência desse processo. Outros fatores que indicam a cirurgia são a persistência dos sintomas, o aumento progressivo dos pseudocistos pancreáticos e complicações. Alguns exemplos de complicações são:

  • Infecção;
  • Ruptura;
  • Hemorragia;
  • Obstrução do trato digestivo.

Durante a realização cirúrgica, o cirurgião tem como opção realizar uma exérese dos pseudocistos ou uma drenagem externa ou interna dos pseudocistos pancreáticos, conhecidas por:

  • cistogastroanastomose;
  • cistoduodenoanastomose;
  • cistojejunoanastomose.

Uma outra medida possível de ser tomada é a utilização da Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica (CPRE). Esse exame pode oferecer uma medida terapêutica e auxiliar no raciocínio da equipe ao montar uma estratégia de drenagem do conteúdo. Isso se mostra tão viável que se tornou rotina a solicitação de uma CPRE prévia à cirurgia.

Drenagem dos pseudocistos pancreáticos: quais as opções?

A drenagem é indicada em pacientes que apresentam sintomas importantes ou complicações, como citamos mais acima. De maneira geral, o manejo e a escolha do tipo de drenagem varia segundo a experiência do profissional.

A drenagem percutânea pode ter a orientação de uma USG ou TC. Nela, um cateter é passado pela cavidade do fluido, drenando-o. Esse fluido é coletado ao longo de algumas semanas, até que essa drenagem seja mínima, quando o cateter é retirado. Uma possível complicação dessa escolha é a possibilidade de formação de uma fístula.

Já na drenagem cirúrgica, é proporcionada uma comunicação entre a cavidade do pseudocisto e o estômago. Essa abordagem costuma ser indicada aos pacientes que falharam nas drenagens percutâneas ou endoscópicas.

Por fim, a drenagem endoscópica, por ser menos invasiva e mais fisiológica, tem se tornado a preferida dentre os cirurgiões. Ela evita a necessidade de ser mantido um dreno externo, com riscos de infecção. A abordagem mais usada é a transpapilar com CPRE, especialmente quando o pseudocisto está adjacente à parede gastroduodenal.

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Perguntas frequentes

  1. O que diferencia um pseudocisto pancreático de um cisto pancreático verdadeiro?
    Os pseudocistos são envolvidos por tecido fibroso, enquanto que os cistos verdadeiros, por tecido epitelial.
  2. Qual é a etiologia mais comum para a formação dessas estruturas?
    A pancreatite alcóolica, seguida pela crônica.
  3. Qual é a abordagem preferida atualmente para o manejo dos pseudocistos pancreáticos?
    A drenagem endoscópica, por ser menos invasiva e mais fisiológica.

Referências

  1. Actual management of pancreatic pseudocysts. Neves, Manoel Martins das. BVS
  2. Approach to walled-off pancreatic fluid collections in adults. Raj J Shah, MD. UpToDate, 2022.
  3. Pseudocisto pancreático. Habashi S, Draganov PV. Pancreatic pseudocyst. World J Gastroenterol 2009; 15(1): 38-47 [PMID: 19115466 DOI: 10.3748/wjg.15.38].