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Tudo que você precisa saber sobre a artrite séptica: epidemiologia, classificação, etiologia, tratamento e diagnóstico.
A artrite séptica é uma inflamação das articulações causada por uma infecção bacteriana. É uma condição médica grave que pode levar a danos permanentes nas articulações se não tratada adequadamente.
Neste artigo, abordaremos a epidemiologia, quadro clínico, diagnóstico e o tratamento da artrite séptica.
Epidemiologia
A artrite séptica pode afetar pessoas de todas as idades, mas é mais comum em idosos e em pessoas com sistema imunológico comprometido. Também é mais comum em homens do que em mulheres.
Algumas das condições médicas que podem aumentar o risco de desenvolver artrite séptica incluem:
- Diabetes;
- HIV;
- Doença renal crônica;
- Neoplasia;
- Alcoolismo;
- Imunodeficiência primária ou secundária;
- Idosos acima de 80 anos e crianças abaixo de 5 anos;
- Prótese articular;
- Lesão articular prévia (ex.: artrite reumatoide, osteoartrite);
- Uso de glicocorticoides,
- Imunossupressores e quimioterápicos;
- Úlceras crônicas e infecções cutâneas;
- Deficiência dos componentes tardios do sistema complemento (C5-C9).
Classificação
Diferente da artrite reativa, que é asséptica e reacional, as artrites sépticas decorrem de invasão direta do micro-organismo na articulação. Trata-se de uma emergência clínica pelo potencial destrutivo articular irreversível.
A artrite séptica pode ser classificada de acordo com:
- Etiologia (bacteriana, fúngica, viral, etc.);
- Fonte de infecção (hematógena, traumática, iatrogênica, etc.);
- Número de articulações afetadas (monoarticular ou poliarticular);
- Tempo de evolução (aguda ou crônica).
A classificação mais comum é baseada na etiologia bacteriana, já que a maioria dos casos é causada por bactérias, e na fonte de infecção, já que isso pode influenciar a escolha do tratamento.
A artrite séptica também pode ser classificada como nosocomial ou adquirida na comunidade, dependendo do local onde a infecção foi adquirida.
Classificação quanto ao tempo de evolução da artrite séptica
As artrites sépticas classificadas como agudas e crônicas podem ainda se subdividir:
- As agudas em gonocócicas e não gonocócicas;
- Já as crônicas: por etiologia fúngica ou micobactérias.
Principais observações
- O Staphylococcus aureus é o principal germe associado a artrite séptica e osteomielite, se considerarmos todas as idades.
- Grandes articulações que suportam carga como os joelhos são as mais comuns de acometimento na artrite séptica.
- A apresentação clínica habitual é de monoartrite.
Fisiopatogenia da artrite séptica
O mecanismo de infecção articular mais comum é a via hematogênica em 70% dos casos, mas pode ocorrer por:
- Disseminação por osteomielite adjacente;
- Iatrogênica após procedimento artroscópico ou artrocentese;
- Trauma penetrante e contiguidade da pele;
- Via linfática de infecção de partes moles próxima a articulação.
Independentemente da via de acesso à articulação, a invasão do microrganismo causa aumento da atividade macrofágica e polimorfonucleares. Logo, a sinóvia adquire um aspecto semelhante ao PANNUS da artrite reumatoide, granulomatosa e proliferativa.
Com o acúmulo dos elementos inflamatórios e exsudativos, ocorre aumento da pressão intra-articular resultando em anóxia e necrose da cartilagem.
Etiologia
A artrite séptica pode ser causada por uma infecção bacteriana, fúngica ou viral na articulação. A maioria dos casos é causada por bactérias, sendo a Staphylococcus aureus a bactéria mais comum envolvida.
Outras bactérias que podem causar artrite séptica incluem Streptococcus pneumoniae, Neisseria gonorrhoeae, Haemophilus influenzae, Escherichia coli, Pseudomonas aeruginosa e Salmonella spp.
A artrite séptica fúngica é menos comum, mas pode ser causada por Candida spp. e Aspergillus spp.
Já a artrite séptica viral é rara e pode ser causada pelo vírus da rubéola, parvovírus B19 e HIV.
Diagnóstico da artrite séptica
O diagnóstico de artrite séptica pode ser desafiador, já que os sintomas iniciais são semelhantes aos de outras condições articulares, como artrite reumatoide e osteoartrite.
Os sintomas incluem:
- Dor intensa na articulação afetada;
- Inchaço;
- Vermelhidão;
- Febre;
- Rigidez articular.
Além disso, a artrite séptica pode afetar mais de uma articulação ao mesmo tempo. A confirmação do diagnóstico é feita por meio de exames de imagem e análise do líquido sinovial.
Artrocentese na artrite séptica
A artrocentese ou punção articular é um procedimento utilizado para fins diagnósticos e terapêuticos (infiltração com corticoide, ácido hialurônico).
Diante de um quadro de monoartrite sem etiologia definida, a artrocentese diagnóstica é mandatória para exclusão de artrite séptica. A técnica de punção difere de acordo com a articulação almejada.
A análise do líquido sinovial é extremamente útil na determinação causal da artrite. O mesmo é submetido a:
- Citologia;
- Bacterioscopia (Gram);
- Cultura;
- Pesquisa de cristais.
De acordo com a coloração, turvação, viscosidade e citologia, o líquido sinovial pode ser classificado.
Classificação do líquido sinovial
O líquido sinovial na artrite séptica geralmente apresenta características que ajudam no diagnóstico da condição. Na maioria dos casos, o líquido sinovial apresenta-se purulento, com alta contagem de leucócitos (geralmente mais de 50.000 células/μL) e com predominância de neutrófilos.
A coloração do líquido pode variar de amarelo turvo a purulento. O pH geralmente é baixo (<7,2), e a glicose está frequentemente diminuída em relação ao soro. Além disso, a cultura do líquido sinovial é frequentemente positiva para o agente causador da infecção.
O líquido sinovial do tipo não inflamatório (I) é característico da osteoartrite, já a maioria das doenças reumatológicas incluindo as autoimunes e microcristalinas terão um líquido inflamatório do tipo II.
Atenção para as doenças que podem ocasionalmente dar um líquido com aspecto séptico, mas que são assépticas, são elas:
- Gota;
- Artrite reumatoide;
- Artrite reativa.
O líquido sinovial na gota e artrite reumatoide são inflamatórios, mas podem vir pseudosépticos.
Seguindo o mesmo raciocínio existem artrites sépticas que podem vir com líquido sinovial inflamatório:
- Gonocócica;
- Fúngica;
- Micobactérias.
Tipos de artrites sépticas
Confira abaixo os dois principais tipos de artrite séptica:
Artrite Séptica Bacteriana Não Gonocócica
Início abrupto de monoartrite (dor, calor e edema) em grandes articulações de membros inferiores como joelhos e quadril, associado a sintomas constitucionais como indisposição, mialgia, febre e calafrios.
Imunossuprimidos, diabéticos e indivíduos com múltiplas comorbidades podem não apresentar febre ou demais sintomas constitucionais.
Ao exame físico além de artrite, nota-se bloqueio articular com limitação dolorosa importante.
Artrite Gonocócica
Resulta da propagação da Neisseria gonorrhoeae (infecção gonocócica disseminada), um diplococo Gram-negativo, tendo como porta de entrada uma infecção sexual adquirida.
É a causa mais comum de artrite séptica em jovens sexualmente ativos, porém a proporção de artrites sépticas gonocócicas é muito inferior as não gonocócicas.
Ocorre mais em mulheres (3 a 4 vezes mais), frequente nos primeiros 7 dias após início da menstruação, durante a gravidez e no pós-parto.
A tríade da artrite gonocócica é:
- Poliartrite
- Tensinovite
- Lesões cutâneas.
Fases das manifestações clínicas
As manifestações clínicas podem ser divididas em fases:
- Bacterêmica: inicial, dura 48 a 72 horas, cursa com febre alta, calafrios e achados da tríade de poliartralgia (aditiva ou migratória), tenossinovite e lesões cutâneas.
- As lesões classicamente são pápulas ou vesículas em tronco e extremidades, poupam a face, são indolores e não pruriginosas. A tenossinovite é mais comum em mãos e pés.
- Supurativa: monoartrite de grandes articulações, principal é o joelho.
Na fase bacterêmica o principal diagnóstico diferencial é a artrite reativa. Já na supurativa, a artrite séptica não gonocócica.
Tratamento para artrites sépticas
O tratamento da artrite séptica envolve o uso de antibióticos intravenosos para tratar a infecção bacteriana subjacente. É importante que o tratamento seja iniciado o mais cedo possível para evitar danos permanentes nas articulações.
Além disso, pode ser necessário drenar o líquido sinovial da articulação afetada para aliviar a dor e reduzir a pressão sobre a articulação.
Em casos graves, pode ser necessária a cirurgia para remover o tecido infectado ou reparar os danos nas articulações.
Tratamento com antibiótico
Não devemos aguardar o resultado da cultura do líquido sinovial para iniciar antibioticoterapia empírica.
O tratamento com antibiótico empírico inicial no recém-nascido deve conter drogas antiestafilocócicas e bactérias Gram-negativas, portanto recomenda-se oxacilina + gentamicina. Já em crianças de 1 mês a 5 anos lembrar da cobertura para hemófilos, portanto o ideal é oxacilina + ceftriaxone.
Adultos jovens com quadro sugestivo de artrite gonocócica realizar ceftriaxone. Nos demais grupos em que não existe forte evidência de germe resistente, o esquema inicial é oxacilina. Caso haja dúvida entre origem gonocócica e não gonocócica inicia-se oxacilina + ceftriaxone.
Se a pesquisa do Gram é positiva, auxilia na escolha do esquema inicial.
A duração da terapêutica da artrite séptica não gonocócica é de 2 a 4 semanas. Concomitante ao tratamento antibiótico está indicada a drenagem da articulação por artroscopia ou artrotomia. O ortopedista deve ser avisado imediatamente na suspeita de artrite séptica.
Nos casos de artrite gonocócica a drenagem cirúrgica raramente é indicada e o uso do ceftriaxone é feito por 7 a 10 dias com melhora muito rápida nas primeiras 48 horas. É prescrito, associado ao ceftriaxone, azitromicina dose única uma vez frequente a presença de Clamídia. Lembrar de tratar o parceiro sexual.
Prognóstico da artrite séptica
Na infecção estafilocócica, 50% evoluem com perda da função articular, em contraste a infecção gonocócica tem um bom prognóstico.
A osteomielite pode ser complicação de artrite séptica ou causa. O método de imagem mais sensível para detecção é a cintilografia óssea. Nos casos de osteomielite é realizada extração de material ósseo para determinar o agente causal, o mais comum continua sendo o S. aureus.
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Referências
- MATOS MA, GUARNIERO R, GODOY JÚNIOR RM. Artrite séptica do quadril. Rev Bras Ortop. 2006;41(6):187-94.
- GOLDENBERG, D. L.; SEXTON, D. J. Septic arthritis in adults. UpToDate, 2022.