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Resumo de colite pseudomembranosa: epidemiologia, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento

Resumo de colite pseudomembranosa: epidemiologia, fisiopatologia, diagnóstico e tratamento

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A colite pseudomembranosa é uma doença diarreica, que pode variar de autolimitada à grave, associada à infecção pelo Clostridium difficile. Esta é uma bactéria anaeróbia gram-positiva formadora de esporos, produtora de toxinas e, na atualidade, uma importante causa de diarreia associada ao uso de antibióticos. 

Epidemiologia

A doença causada pelo C. difficile é na atualidade uma importante causa de diarreia associada aos cuidados de saúde, principalmente nos hospitais, respondendo por 15% a 25% dos casos de diarreia associada ao uso de antibióticos. 

Nos EUA calcula-se que ocorram cerca de 500 mil casos por ano, somadas as recorrências e casos iniciais, com 20 mil óbitos. Em alguns hospitais americanos as infecções por C. difficile são mais frequentes do que a infecção pelos estafilococos MRSA. 

Acredita-se que essa doença seja subdiagnosticada no Brasil, em parte devido à pouca disponibilidade dos exames comprobatórios na rede pública. 

Em relação aos antibióticos, muitos casos iniciais foram atribuídos à clindamicina. No entanto, o uso crescente de penicilinas e cefalosporinas levou à implicação dessas classes de antibióticos também como precipitantes. 

Fisiopatologia 

C. difficile é um bacilo anaeróbio gram-positivo, formador de esporos e produtor de toxinas, descrito pela primeira vez em 1935. Foi denominado “clostridium difícil” devido à dificuldade relacionada ao seu isolamento e crescimento em meio convencional.

C. difficile

A transmissão basicamente é feita de pessoa a pessoa, via fecal-oral. O contato com objetos e utensílios contaminados pelos esporos e posterior deglutição é o mecanismo preponderante.

O C. difficile produz duas exotoxinas, toxina A e B, que se ligam a receptores nas células epiteliais intestinais, causando inflamação e diarreia.

A toxina A estimula a produção de quimiocinas, citocinas e a ativação de neutrófilos e macrófagos, ocasionando um processo inflamatório que agrava as lesões celulares, causando perda de líquido, diarreia, ulceração e formação de exsudato pseudomembranoso. A toxina B interrompe as fibras de actina do citoesqueleto, causando destruição epitelial.

Indivíduos com níveis baixos ou indetectáveis ​​de anticorpos contra toxinas do C. difficile têm maior probabilidade de desenvolver diarreia do que aqueles com níveis detectáveis ​​de anticorpos antitoxina.

Quadro clínico de colite pseudomembranosa

O período de incubação mais citado é de dois a três dias, embora existam discordâncias. O quadro clínico da infecção pode variar de quadros assintomáticos (cerca de 50% dos casos)  a colites fulminantes eventualmente fatais, sendo que estas correspondem a cerca de 10% a 15% dos casos.

Nos casos leves,  a diarreia é a manifestação principal; em geral o paciente apresenta menos de 10 evacuações diárias, aquosas, às vezes com presença de muco. Melena, enterorragia ou hematoquezia também são raras na doença. Dor abdominal em cólica é comum, principalmente no andar inferior do abdome. 

Já os casos graves evoluem geralmente com febre alta (>38,5oC), diarreia com >10 evacuações diárias, aquosa, mucosa e eventualmente sanguinolenta. Desidratação e distúrbios hidroeletrolíticos são comuns. A dor abdominal é mais intensa e difusa, podendo ocorrer espontaneamente. 

Há febre alta, frequentemente acima dos 38,7oC. Diminuição do apetite, náuseas e vômitos são bem mais frequentes e a leucocitose está acima de 15.000/mm3. Além disso, os níveis de albumina diminuem para <3g/dL e há insuficiência renal aguda.

Os critérios propostos para colite pseudomembranosa grave segundo a IDSA (Infectious Disease Society of America) incluem dor abdominal, contagem de leucócitos> 15.000 células / mL e/ou creatinina sérica ≥1,5 mg / dL. 

Diagnóstico de colite pseudomembranosa 

O diagnóstico de diarreia por infecção pelo C. difficile deve ser suspeitado sempre que houver diarreia associado ao uso atual ou recente de antimicrobianos. É possível que o paciente desenvolva o quadro até cerca de três meses após o uso, sendo portanto necessário o questionamento ao colher a história.

O diagnóstico é estabelecido a partir do exame de fezes ou da colonoscopia/retossigmoidoscopia. Pode-se pesquisar o bacilo ou as toxinas A e B em fezes diarreicas. 

Quando há presença de colite pseudomembranosa na colonoscopia, o cólon é recoberto por pseudomembranas brancas ou amareladas, salteadas a confluentes.

Colite pseudomembranosa na colonoscopia. Uptodate, 2021.

Tratamento de colite pseudomembranosa 

O tratamento da doença causada por C. difficile é feito, primeiramente, com a retirada do antibiótico em uso, caso o paciente ainda esteja fazendo uso deste. Para casos leves a moderados da doença, utiliza-se metronidazol via oral, 500mg, de 8h/8h, durante 10 a 14 dias.

Em casos moderados, iremos considerar internamento para tratamento hospitalar. Hidratação, monitoração e adminitração de metronidazol oral, no mesmo esquema dos quadros leves, ou vancomicina via oral, de 6h/6h, por 14 dias.

Para o tratamento inicial dos quadros graves, recomenda-se vancomicina ou fidaxomicina oral por 10 dias. No entanto, a fidaxomicina não está disponível no Brasil.  Ambos são mais eficazes do que o metronidazol, mas este pode ser associado à vancomicina. 

Formas graves complicadas são tratadas com vancomicina, 125mg, de 6h/6h, VO, por 10 a 14 dias associada ao metronidazol, 500mg, EV, de 8h/8h, por 10 a 14 dias, e iremos considerar abordagem cirúrgica no seguintes casos: choque; sepse; alterações mentais; reação leucemoide com mais de 50.000 leucócitos/mm3; lactato maior igual a 5mmol/L; íleo paralítico; evolução fulminante; perfuração intestinal; megacólon tóxico não responsivo e enterite necrotizante.

Em caso de recorrência, as primeiras recorrências são ainda tratadas com esquema de vancomicina. A partir da terceira recorrência, iremos considerar transplante de microbiota fecal.

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Referências:

  1. J. pediatria. Rio J. 1999; Colite pseudomebranosa, Clostridium difficile, antibióticos. 
  2. KELLY, Ciarán P. LAMONT, Thomas. BAKKEN, Johan S. Clostridioides (formerly Clostridium) difficile infection in adults: Treatment and prevention. © 2021 UpToDate, Inc. and/or its affiliates.